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Uma equipa de astrofísicos e cientistas cidadãos identificou o que poderão ser alguns dos últimos planetas observados pelo aposentado telescópio espacial Kepler da NASA durante a sua missão de quase uma década.

A última campanha de observação do telescópio espacial Kepler da NASA durou apenas um mês. Quando a nave espacial começou a ficar sem combustível de controlo de atitude, não conseguiu manter a sua posição durante tempo suficiente para recolher observações úteis. No final, os astrónomos só obtiveram cerca de sete dias de dados de alta qualidade. Uma equipa de investigação trabalhou com um grupo de cidadãos cientistas e astrónomos profissionais e encontrou três planetas no último conjunto de dados.
Crédito: NASA/JPL-Caltech (K. Walbolt)
Os três exoplanetas – mundos para lá do nosso Sistema Solar – têm todos um tamanho entre o da Terra e o de Neptuno e orbitam intimamente as suas estrelas.
“São planetas bastante medianos no grande esquema das observações do Kepler”, disse Elyse Incha, estudante na Universidade de Wisconsin-Madison.
“Mas são excitantes porque o Kepler observou-os durante os seus últimos dias de funcionamento. Isto mostra como o Kepler era bom a caçar planetas, mesmo no fim da sua vida”.
Um artigo sobre o trio planetário, liderado por Incha, foi publicado na edição de 30 de maio da revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.
O Kepler foi lançado em Março de 2009. O objectivo inicial da missão era monitorizar continuamente um pedaço de céu nas constelações de Cisne e Lira.
Este longo período de observações permitiu ao satélite seguir as alterações no brilho estelar provocadas pela passagem de planetas em frente das suas estrelas, eventos designados por trânsitos.
Ao fim de quatro anos, o telescópio tinha observado mais de 150.000 estrelas e identificado milhares de potenciais exoplanetas.
Foi a primeira missão da NASA a encontrar um mundo do tamanho da Terra a orbitar dentro da zona habitável da sua estrela, a gama de distâncias em que pode existir água líquida à superfície de um planeta.
Em 2014, a nave espacial teve problemas mecânicos que interromperam temporariamente as observações.
A equipa do Kepler concebeu uma solução que lhe permitiu retomar as operações, mudando o seu campo de visão aproximadamente de três em três meses, um período chamado campanha. Esta missão renovada, K2, durou mais quatro anos e observou mais de 500.000 estrelas.
Quando o Kepler foi aposentado, em Outubro de 2018, tinha ajudado a descobrir mais de 2600 exoplanetas confirmados e muito mais candidatos.
A última campanha da missão K2, a 19.ª, durou apenas um mês. Como a nave espacial começou a ficar com pouco combustível de controlo de atitude, não conseguiu manter a sua posição durante tempo suficiente para recolher observações úteis. No final, os astrónomos só tiveram cerca de sete dias de dados de alta qualidade da Campanha 19.
Incha e a sua equipa trabalharam com o VSG (Visual Survey Group), uma colaboração entre cientistas cidadãos e astrónomos profissionais, para analisar este conjunto de dados em busca de exoplanetas.
Os cientistas cidadãos procuraram sinais de mundos em trânsito em todas as curvas de luz da Campanha 19, que registam a forma como as estrelas monitorizadas brilharam ou escureceram.
“As pessoas que fazem levantamentos visuais – olhando para os dados a olho nu – podem detectar novos padrões nas curvas de luz e encontrar objectos individuais que são difíceis de detectar por levantamentos automatizados.
E mesmo nós não os conseguimos apanhar a todos”, disse Tom Jacobs, antigo oficial da Marinha dos EUA e membro da equipa do VSG. “Fiz três vezes o levantamento visual das observações do K2 e ainda há descobertas por encontrar”.
Jacobs e outros encontraram um trânsito para cada um dos três candidatos a planeta, cada um orbitando uma estrela diferente, no conjunto de dados de alta qualidade.
Após a sua descoberta inicial, Incha e a sua equipa também voltaram a analisar os dados de menor qualidade do resto da Campanha 19 e encontraram mais um trânsito para cada uma das três estrelas assinaladas no levantamento visual.
“Os segundos trânsitos destes dois candidatos a planeta ajudaram-nos a confirmar a sua descoberta”, disse Andrew Vanderburg, professor assistente de física no Instituto Kavli para Astrofísica e Investigação Espacial do MIT (Massachusetts Institute of Technology) em Cambridge, EUA.
“Ninguém tinha encontrado planetas neste conjunto de dados antes, mas a nossa colaboração conseguiu encontrar três. E estamos realmente a fazer frente aos últimos dias, aos últimos minutos, das observações recolhidas pelo Kepler”.
Usando a informação do trânsito, Incha e a sua equipa calcularam os potenciais tamanhos e períodos orbitais dos mundos. O planeta mais pequeno, K2-416 b, tem cerca de 2,6 vezes o tamanho da Terra e orbita a sua estrela anã vermelha a cada 13 dias. K2-417 b, com pouco mais de três vezes o tamanho da Terra, também orbita uma estrela anã vermelha, mas completa uma órbita a cada 6,5 dias.
O último planeta, não confirmado, EPIC 246251988 b, tem quase quatro vezes o tamanho da Terra e orbita a sua estrela semelhante ao Sol em cerca de 10 dias (os dois primeiros planetas tomam o seu nome da era K2 da missão, o último do catálogo EPIC – Ecliptic Plane Input Catalog – de estrelas nos campos K2).
O TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA, que foi lançado em Abril de 2018, também utiliza o método de trânsito, observando grandes faixas do céu de cada vez.
Durante Agosto e Setembro de 2021, o TESS observou a zona do espaço que contém os três novos planetas do Kepler. Os astrónomos foram capazes de detectar mais dois potenciais trânsitos para K2-417 b.
“De muitas formas, o Kepler passou a tocha da caça exoplanetária para o TESS”, disse Knicole Colón, cientista do projecto TESS no Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, no estado norte-americano de Maryland, que trabalhou na missão Kepler durante vários anos.
“O conjunto de dados do Kepler continua a ser um tesouro para os astrónomos e o TESS ajuda a dar-nos novos conhecimentos sobre as suas descobertas”.
// NASA (comunicado de imprensa)
// MIT (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (Monthly Notices of the Royal Astronomical Society)
// Artigo científico (arXiv.org)
Astronomia – Centro Ciência Viva do Algarve
2 de Junho de 2023
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published in: 4 meses ago