601: Planeta recém-descoberto tem a órbita mais longa já detectada pela missão TESS

 

CIÊNCIA // ASTRONOMIA // MISSÃO TESS

Dos mais de 5.000 planetas que se sabe existirem para lá do nosso Sistema Solar, a maioria orbita as suas estrelas a uma distância surpreendentemente pequena.

Mais de 80 por cento dos exoplanetas confirmados têm órbitas inferiores a 50 dias, o que coloca estes mundos tórridos pelo menos duas vezes mais perto da sua estrela do que Mercúrio está do nosso Sol – e alguns, ainda mais perto do que isso.

Impressão de artista dos dois planetas no sistema TOI-4600.
Crédito: Tedi Vick

Os astrónomos estão a começar a ter uma ideia geral da formação, evolução e composição destes planetas. Mas o quadro é muito mais confuso para os planetas com períodos orbitais mais longos.

Os mundos longínquos, com órbitas que duram meses ou anos, são mais difíceis de detectar e, por isso, as suas propriedades têm sido mais difíceis de discernir.

Agora, a lista de planetas de longo período ganhou duas entradas. Astrónomos do MIT (Massachusetts Institute of Technology), da Universidade do Novo México (UNM) e de outros locais descobriram um sistema raro que contém dois planetas de longo período em órbita de TOI-4600, uma estrela próxima que fica a 815 anos-luz da Terra.

A equipa descobriu que a estrela alberga um planeta interior com uma órbita de 82 dias, semelhante à de Mercúrio, enquanto um segundo planeta exterior completa uma orbita a cada 482 dias, o que o coloca algures entre as órbitas da Terra e de Marte.

A descoberta foi feita com base em dados do TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA – uma missão liderada pelo MIT que monitoriza as estrelas mais próximas em busca de sinais de exoplanetas.

O novo planeta, mais distante, tem o período mais longo que o TESS detectou até à data. É também um dos mais frios, com cerca de -83º C, enquanto o planeta interior é mais temperado, com 77º C.

Ambos os planetas são provavelmente gigantes gasosos, semelhantes a Júpiter e Saturno, embora a composição do planeta exterior possa ser mais uma mistura de gás e gelo.

Os dois planetas fazem a ponte entre os “Júpiteres quentes” – os planetas tórridos e de órbita curta que constituem a maioria das descobertas exoplanetárias – e os gigantes gasosos muito mais frios e de período mais longo do nosso Sistema Solar.

“Estes sistemas de período mais longo são uma gama comparativamente inexplorada”, diz Katharine Hesse, membro da equipa técnica do Instituto Kavli de Astrofísica e Investigação Espacial do MIT.

“Como estamos a tentar ver onde o nosso Sistema Solar se enquadra em comparação com os outros sistemas que encontrámos lá fora, precisamos realmente destes exemplos mais extremos para melhor compreender essa comparação. Porque muitos dos sistemas que encontrámos não se parecem nada com o nosso Sistema Solar”.

Hesse e os seus colegas, incluindo o autor principal Ismael Mireles, um estudante da Universidade do Novo México, publicaram os seus resultados na revista The Astrophysical Journal Letters.

Trabalho por sectores

O TESS monitoriza as estrelas mais próximas em busca de sinais de exoplanetas, apontando para um sector do céu e medindo continuamente o brilho das estrelas nesse sector durante 30 dias, antes de passar para o sector seguinte.

Os cientistas utilizam “pipelines”, ou seja, pesquisas algorítmicas, para passar a pente fino as medições em busca de quedas de brilho que possam ter sido causadas pela passagem de um planeta em frente da sua estrela.

Em 2020, um pipeline detectou um possível trânsito numa estrela do hemisfério norte, perto da constelação de Dragão. A estrela foi categorizada como TOI-4600 (TOI significa “TESS Object of Interest”).

O trânsito inicial foi estudado em pormenor pelo TSTPC WG (TESS Single Transit Planet Candidate Working Group), uma equipa de cientistas do MIT, da UNM e de outros locais que procuram sinais de planetas de período mais longo em eventos de trânsito único.

“Para missões como a TESS, em que só se olha para cada região do céu durante 30 dias, é preciso acumular o número de observações para se conseguir obter dados suficientes para encontrar planetas com órbitas superiores a um mês”, observa Hesse.

O grupo procurou a estrela noutros sectores dos dados do TESS e eventualmente identificou mais três trânsitos, semelhantes ao primeiro. A partir destes quatro eventos, os cientistas foram capazes de determinar que a fonte era um planeta – TOI-4600 b – com uma órbita relativamente longa de 82 dias.

A equipa também detectou um quinto trânsito, embora este não estivesse sincronizado com os outros sinais. Perguntaram-se: poderá o trânsito ser de outra estrela que está a eclipsar temporariamente a primeira? Ou poderá ser um segundo planeta em órbita?

Gigantes no céu

Em 2021, quando Mireles se juntou ao grupo, retomou onde a equipa tinha ficado, procurando mais observações do TESS que explicassem o último e intrigante trânsito.

“A cada sector de dados que chegava, eu procurava ver se havia um segundo trânsito e, nos primeiros cinco sectores, não havia”, recorda Mireles. “Depois, em Julho do ano passado, vimos qualquer coisa.”

Na verdade, viram duas coisas: um trânsito que apareceu no mesmo ciclo de 82 dias, o que confirmou ainda mais a existência de um planeta com órbita longa; e um segundo trânsito, que foi detectado 964 dias depois do trânsito anterior, fora de sincronia.

Estes dois últimos trânsitos eram semelhantes em profundidade, ou seja, a quantidade de luz que foi atenuada, sugerindo que ambos foram produzidos por um único objecto que estava a orbitar a estrela, quer a cada 964 dias, quer a cada 482 dias.

Afinal de contas, raciocinou a equipa, o TESS podia simplesmente não estar a olhar na direcção da estrela para apanhar a passagem do planeta na marca dos 482 dias. A equipa usou um modelo para simular o aspecto de um planeta com ambos os períodos orbitais e concluiu que a órbita de 482 dias era mais provável.

Para confirmar que tinham identificado dois planetas de longo período, os investigadores focaram-se na estrela usando vários telescópios terrestres. Estas observações ajudaram a equipa a excluir cenários de falsos positivos, tais como uma segunda estrela a eclipsar a estrela principal.

No final, concluíram que a estrela alberga de facto dois planetas de longo período: TOI-4600 b, um gigante ameno, semelhante a Júpiter; e TOI-4600 c, um gigante gelado e o planeta de período mais longo detectado pelo TESS até à data.

“É relativamente raro vermos dois planetas gigantes num sistema”, diz Hesse. “Estamos habituados a ver Júpiteres quentes que estão perto das suas estrelas e normalmente não lhes encontramos companheiros, muito menos companheiros gigantes. Este sistema tem uma configuração mais única”.

A distância entre os dois planetas, que é aproximadamente a mesma que a distância entre Mercúrio e Marte, implica que podem existir outros planetas no sistema.

“Queremos ver se há evidências da existência de mais planetas”, diz Mireles. “Há definitivamente muito espaço para potenciais planetas, quer mais perto, quer mais longe. E mostrámos que o TESS é capaz de encontrar Júpiteres amenos e frios”.

// MIT (comunicado de imprensa)
// Universidade do Novo México (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (The Astrophysical Journal Letters)
// Artigo científico (arXiv.org)

CCVALG
5 de Setembro de 2023


Ex-Combatente da Guerra do Ultramar, Web-designer,
Investigator, Astronomer and Digital Content Creator



published in: 4 semanas ago

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Astrónomos descobrem um sistema planetário crucial para compreender o mecanismo de formação das misteriosas “super-Terras”

 

CIÊNCIA // ASTRONOMIA // SUPER-TERRAS

Um estudo realizado por investigadores da Universidade de Liège – utilizando observações do telescópio TESS da NASA – apresenta a detecção de um sistema com dois planetas ligeiramente maiores do que a Terra a orbitar uma estrela fria numa dança sincronizada. Denominado TOI-2096, o sistema está situado a 150 anos-luz da Terra. Esta descoberta foi publicada na revista Astronomy & Astrophysics.

Impressão artística do sistema TOI-2096.
Crédito: Lionel J. Garcia

A descoberta é o resultado de uma estreita colaboração entre universidades europeias e americanas e foi possível graças à missão espacial TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite), que tem por objectivo encontrar planetas que orbitem estrelas brilhantes próximas.

“O TESS está a realizar um estudo de todo o céu utilizando o método de trânsito, ou seja, monitorizando o brilho estelar de milhares de estrelas na procura de uma ligeira diminuição de brilho, que poderia ser provocado por um planeta que passa entre a estrela e o observador.

No entanto, apesar do seu poder de detecção de novos mundos, a missão TESS precisa do apoio de telescópios terrestres para confirmar a natureza planetária dos sinais detectados”, explica Francisco J. Pozuelos, astrofísico, primeiro autor do artigo científico, antigo membro do laboratório ExoTIC (Unidade de Investigação em Astrobiologia/Faculdade de Ciências, ULiège) e que passou a integrar o IAA-CSIC (Instituto Astrofísica Andalucía – Consejo Superior de Investigaciones Científicas) na Espanha.

Os planetas TOI-2096 b e TOI-2096 c foram observados com uma rede internacional de telescópios terrestres, permitindo a sua confirmação e caracterização. A maior parte dos trânsitos foram obtidos com telescópios dos projetos TRAPPIST e SPECULOOS, liderados pela Universidade de Liège.

“Ao fazer uma análise exaustiva dos dados, descobrimos que os dois planetas estavam em órbitas ressonantes: por cada órbita do planeta exterior, o planeta interior orbita a estrela duas vezes”, diz Mathilde Timmermans, estudante de doutoramento no laboratório ExoTIC da ULiège e segunda autora do artigo científico.

Os seus períodos estão, portanto, muito próximos de serem um múltiplo um do outro, com cerca de 3,12 dias para o planeta b e cerca de 6,38 dias para o planeta c. Trata-se de uma configuração muito particular, que provoca uma forte interacção gravitacional entre os planetas.

Esta interacção atrasa ou acelera a passagem dos planetas em frente da sua estrela e pode levar à medição das massas planetárias utilizando telescópios maiores num futuro próximo”.

Os investigadores responsáveis pela descoberta estimam que o raio do planeta b – o mais próximo da sua estrela – é 1,2 vezes superior ao da Terra, daí o nome “super-Terra”.

As suas propriedades poderão ser semelhantes às da Terra: um planeta com uma composição maioritariamente rochosa, possivelmente rodeado por uma fina atmosfera.

Da mesma forma, o raio do planeta c corresponde a 1,9 vezes o raio da Terra e a 55% do de Neptuno, o que poderá colocar o planeta na categoria dos “mini-Neptunos”, planetas compostos por um núcleo rochoso e gelado rodeado por atmosferas extensas ricas em hidrogénio ou água, como Úrano e Neptuno no nosso Sistema Solar.

Estes tamanhos são muito interessantes porque o número de planetas com um raio entre 1,5 e 2,5 vezes o da Terra é inferior ao que os modelos teóricos prevêem, tornando estes planetas uma raridade.

Estes planetas são de importância crucial devido aos seus tamanhos”, observa Mathilde Timmermans, “a formação de super-Terras e mini-Neptunos permanece actualmente um mistério. Vários modelos de formação tentam explicá-lo, mas nenhum se adapta perfeitamente às observações.

TOI-2096 é o único sistema encontrado até à data com uma super-Terra e um mini-Neptuno precisamente nos tamanhos em que os modelos se contradizem. Por outras palavras, TOI-2096 pode ser o sistema que estávamos à procura para compreender como é que estes sistemas planetários se formaram”.

“Além disso, estes planetas estão entre os melhores da sua categoria para estudar as suas possíveis atmosferas”, explica Francisco J. Pozuelos.

“Graças aos tamanhos relativos dos planetas em comparação com o da estrela hospedeira, bem como ao brilho estelar, achamos que este sistema é um dos melhores candidatos para um estudo detalhado da sua atmosfera com o Telescópio Espacial James Webb. Esperamos ser capazes de o fazer rapidamente, em coordenação com outras universidades e centros de investigação.

Estes estudos ajudarão a confirmar a presença de uma atmosfera, extensa ou não, à volta dos planetas b e c, dando-nos assim pistas sobre o seu mecanismo de formação”.

// Universidade de Liège (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (Astronomy & Astrophysics)
// Artigo científico (arXiv.org)

Astronomia – Centro Ciência Viva do Algarve
30 de Maio de 2023


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e Criador de Conteúdos Digitais


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