🇵🇹⚖️ MP // ⚖️❓ JUSTIÇA // 🇧🇷 GÉMEAS BRASILEIRAS
Inquérito “não corre sobre pessoa determinada”, mas MP quer conhecer processo que envolveu as crianças tratadas no Santa Maria com um dos medicamentos mais caros do mundo. Em relação a eventual intervenção do Presidente da República, se tal se confirmar, a acção teria de ser votada no Parlamento e a investigação correria no Supremo.

Tratamento às crianças foi ministrado no Hospital Santa Maria em Junho de 2020.
© Álvaro Isidoro/Global Imagens
O Ministério Público abriu um inquérito ao caso das gémeas de origem brasileira que foram tratadas no Hospital de Santa Maria com um dos medicamentos mais caros do mundo. O processo está no Departamento de Investigação e Acção Penal Regional de Lisboa “e, por ora, não corre contra pessoa determinada”, segundo o MP.
Esta situação foi conhecida há cerca de um mês, quando o programa Exclusivo, da TVI, noticiou o caso. As gémeas, com cerca de 2 anos, sofrem de atrofia muscular espinal, uma doença incurável, mas cujo avanço pode ser travado com medicação. António Levy Gomes, médico coordenador da Unidade de Neuro-pediatria do Hospital de Santa Maria revelou uma alegada “cunha” à TVI: “O que corria nos corredores era que o tratamento ocorreu por influência do Presidente da República.”
Às crianças foi ministrado o Zolgensma, conhecido por ser o medicamento mais caro do mundo, que no início da sua comercialização tinha o valor de dois milhões de euros.
Desde que o caso foi conhecido registaram-se várias declarações que lançaram mais dúvidas sobre a situação. Aqui ficam as explicações possíveis até ao momento para o entender.
Quem falou sobre o suposto favorecimento?
A mãe das crianças, Daniela Martins, é cidadã luso-brasileira. Numa primeira ocasião, quando chegou a Portugal com as crianças, os serviços médicos terão recusado o tratamento. “Chorei nos corredores do hospital”, disse a mulher a um canal de televisão do seu país. Entretanto, sem saber que estava a ser gravada, a luso-brasileira assumiu que pôs em marcha os seus “contactos”. “Usei o “pistolão”. Conhecia a nora do Presidente, que conhecia o ministro da Saúde [na altura Marta Temido], que mandou um e-mail para lá e falou “E o caso das meninas?”. Eles começaram a receber ordens de cima.”
Quando é que as crianças receberam o Zolgensma?
As meninas receberam o tratamento, de toma única, por via endovenosa em Junho de 2020.
Este tratamento tem vantagens para as crianças?
As meninas já estavam a receber outro tratamento no Brasil. À TVI, o neuro-pediatra José Pedro Vieira garantiu que “o tratamento não é curativo. A deficiência que já existia permanece”. O antigo bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, concorda com o colega e diz que o medicamento, “em termos de eficácia não acrescenta nada”. No entanto, Daniela Martins, mãe das crianças, afiança que as filhas ficaram “mais ágeis e fortes”, sobretudo na zona dos braços, após a toma do Zolgensma, em Portugal.
Quem autorizou a aquisição do fármaco por parte do hospital?
O medicamento ainda não está aprovado pela Autoridade Europeia do Medicamento e, por isso, foi necessária uma autorização especial para a sua aquisição. O Infarmed autorizou a compra do medicamento dois dias depois de este ter sido requisitado. Porém, no dia 21 de Outubro de 2021, esta entidade veio explicar as diferenças entre o Zolgensma e o outro medicamento, com o qual as meninas já estavam a ser tratadas no Brasil. O medicamento mais caro do mundo tem de ser ministrado até aos 2 anos de idade e é de toma única. O outro fármaco tem de ser tomado de quatro em quatro meses, através de uma injecção na medula, para toda a vida.
O Presidente da República está envolvido na alegada “cunha”?
Marcelo Rebelo de Sousa, questionado pelos jornalistas, disse não se lembrar se alguma vez o filho, Nuno Rebelo de Sousa, lhe tinha falado no caso das gémeas brasileiras. “À distância de quatro anos, a mãe tem essa ideia de que foi por “cunha”. Então alguém, com muita influência, passou por cima de Belém, do primeiro-ministro e da sra. ministra. A “cunha” deve ter surgido de outro plano ou então não aconteceu! Se o meu filho me falou… francamente não me lembro”, assegurava o Presidente. Porém, o médico António Levy Gomes revelou um e-mail, trocado com Marcelo Rebelo de Sousa, em que este se contradiz. O Presidente terá escrito: “No meio de milhentos pedidos e solicitações, falou-me o meu filho Nuno, no caso específico de luso-brasileiros no Brasil. Disse-lhe logo de imediato que não havia privilégio algum para ninguém e, por maioria de razão, para filho de Presidente”.
O que disse mais tarde?
Adiante, o Presidente assumiu que chegou um pedido, à Casa Civil, e que seria “uma questão relevante”. Foram enviadas duas cartas: uma para o gabinete do primeiro-ministro e outra para o gabinete do secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.
O que diz Nuno Rebelo de Sousa?
O filho do Presidente foi abordado à entrada de um evento da Web Summit e remeteu-se ao silêncio. A mãe das crianças será conhecida da sua mulher.
Foi a primeira vez que o medicamento foi ministrado em Portugal?
Não. Portugal foi dos primeiros países europeus a adoptar o Zolgensma no tratamento da atrofia muscular espinal. Matilde, de 4 meses, e Natália, de 11 meses, foram as primeiras crianças a receber este tratamento em Portugal, no final de Agosto de 2019. No Brasil, a mãe das gémeas Maité e Lorena soube do caso e tentou a sua sorte, dado que tem dupla nacionalidade: portuguesa e brasileira. Foi ao Consulado-Geral de Portugal em S. Paulo, onde fez o pedido de naturalização das filhas, no dia 2 de Setembro de 2019. O pedido foi aprovado duas semanas depois, a 16 de Setembro. Apesar de, supostamente, haver um tempo de espera de vários meses para a aprovação da nacionalidade, os registos garantem que não houve nada de anormal neste processo.
Outras crianças estrangeiras conseguiram ter este tratamento em Portugal?
Não. Um casal luso-canadiano, Ricardo e Jéssica Batista, fez o mesmo pedido mas não conseguiu que a filha, Daniela, recebesse o medicamento.
DN
Isabel Laranjo
25 Novembro 2023 — 07:00
Ex-Combatente da Guerra do Ultramar, Web-designer,
Investigator, Astronomer and Digital Content Creator
published in: 4 dias ago