400: Poderá o epicentro da desunião unir Portugal?

 

– As múmias, quando saem dos sarcófagos, levantam poeira do passado em que sempre viveram. Quer em vida, quer em estado mumificado.

🇵🇹 OPINIÃO

Se há características que devem ser reconhecidas em Cavaco Silva são a sua persistência e determinação. O grande líder do PPD/PSD escreveu hoje mais um artigo de opinião.

Desta feita tenta convencer os portugueses de que as contas certas são irrelevantes, mesmo que ainda recentemente as agências internacionais tenham provado o contrário. Para Cavaco, as contas certas são uma “armadilha que o Governo socialista montou para (…) desviar a atenção (…) dos graves problemas do país”.

Não vale a pena tecer aqui comentários anti tecnocratas. Em bom rigor, a tecnocracia caiu em desuso há décadas. Quando regressou mais tarde à esfera política, fê-lo pela mão dos políticos mas apenas para contar com o apoio essencial dos técnicos enquanto meio auxiliar na decisão política.

Voltando ao artigo de opinião do conceituado professor de economia, destaque-se a sua sugestão de implementação do orçamento base zero. A primeira questão é esta: será que o futuro Secretário-geral do PS estará nessa disposição?

Sim, do PS, porque se Cavaco entendesse que Luís Montenegro poderia vencer as eleições já Montenegro teria anunciado essa medida (como o bom aluno que tem sido). Portanto, até agora e em matéria de propostas apresentadas pelo PSD, incluindo no congresso do partido, o resultado é sofrível.

Já que se mencionou o Congresso do PSD, cujo lema foi UNIR PORTUGAL, a pouco mais se assistiu do que um saudosista regresso ao passado. UNIR PORTUGAL através de um abraço pomposo aos líderes de há 30 anos, Cavaco Silva e Manuela Ferreira Leite. Então e os novos líderes? E o futuro?

Como pretende o PSD de Montenegro unir Portugal se não consegue unir o próprio partido? Onde estiveram os ex-primeiros-ministros Durão Barroso, Santana Lopes e Passos Coelho?

E as figuras que não chegaram a exercer o poder, como Fernando Nogueira, Marques Mendes, Luis Filipe Menezes ou Rui Rio? Como pode algum partido ambicionar unir seja o que for quando abafa 30 anos de história política?

Presentemente, o denominador comum no PSD é responsabilizar os outros pelo crescimento da extrema direita quando o próprio partido não consegue unir ou arrumar a casa.

É no mínimo estranho e preocupante ouvir alguém a falar de futuro, de união ou de alternativa, quando se rodeia apenas do passado e apaga a sua própria história.

Diz o ditado popular: “Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és”. Neste caso, basta ver com quem não anda Luís Montenegro para saber quem é, o que pode oferecer ao país e que não é desta que o PSD poderá ser uma alternativa ao PS.

O país e o mundo em que vivemos mudaram muito. De tal forma que louvar e querer perpetuar o que (respeitavelmente) se viveu em 1995 é obsoleto e demonstra uma enorme falta de visão contemporânea e de futuro. Portugal não esquece datas, nem a sua história, mas o que nos move verdadeiramente é o que ainda está para vir, não aquilo que já passou.

DN
Manuel Portugal Lage
04 Dezembro 2023 — 20:52


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321: Novembro 2023, versão 2.0

 

🇵🇹 OPINIÃO

Após mais uma comemoração do 5 de Outubro, em que o edil da capital se olvidou do “Viva a República” no final do seu discurso, Carlos Moedas decidiu cavar ainda mais o fosso ideológico entre portugueses e ele próprio – enquanto como homem “moderado” e “sensato” que aparenta ser.

Em vez de unir as pessoas em torno do que é mais forte, decidiu trazer como grande mote as comemorações do 25 de Novembro.

Para o PS, força política que em 75 venceu as eleições democráticas, tendo levado a cabo o 25 de Novembro e nunca tendo alterado a sua posição (a da defesa da democracia e da liberdade), este anúncio soou a algo requentado.

Uma clarificação importante: ao contrário do que a máquina de propaganda de Moedas fez crer, esta não foi a primeira vez que a Câmara de Lisboa comemorou o 25 de Novembro. Para quem tem boa memória, em 2015, Fernando Medina descerrou uma placa de “Homenagem do povo de Lisboa aos militares e políticos que que em 25 de Novembro de 1975 lutaram pela consolidação de um Portugal democrático, pluralista e livre”.

Relembra-se ainda que a referida placa está localizada na Calçada da Ajuda, junto ao Regimento de Lanceiros n.º 2 do Exército português. Para além desse reconhecimento, fez ainda parte da comemoração uma exposição na via pública intitulada “Revolução e Democracia – do 25 de Abril ao 25 de Novembro”.

Agora que está esclarecido o primeiro mal-entendido dos últimos dias, muito se tem falado da necessidade de moderação. Talvez valha a pena enquadrar e perceber as razões, uma vez que o tema é deveras relevante.

Tudo começou quando as forças minoritárias que sustentam o Executivo Municipal de Lisboa, na Assembleia Municipal, tentaram fazer passar um voto de comemoração do 25 de Novembro. Como é sabido, trata-se de um momento de antagonismo na comunidade em que vivemos, contrariando o que se defende habitualmente como “moderação”.

Aliás, já em 2015 Fernando Medina havia dito, como eu próprio este ano, que “está no momento de deixarmos de ver determinados tipos de eventos como propriedade deste ou daquele, ou pior, como uns contra os outros.”

Portugal e os portugueses não precisam de quem proceda a ajustes de contas com a história. Esse modelo de acção apenas opõe portugueses contra portugueses. O nosso país não privilegia quem se apouque ou se tente valorizar desvalorizando os restantes.

A vida real dos portugueses não se deve resumir a uma ou duas narrativas da Disney, ou a um reconhecimento de incompetência ou incapacidade, que qualquer um dos destinatários dessas histórias percebe e já sabe há muito.

Este fim-de-semana ouviu-se muito ruído vindo da margem sul do Tejo, cujo eco pode relevar o exemplo preconizado por Frei Tomás: faz como ele diz e não faças como ele faz. Efectivamente, de Almada não se testemunhou qualquer moderação.

No que se refere a propostas alternativas, nada que já não se esperasse: supostamente, umas boas e outras novas, mas é pena que as novas não sejam boas e as boas não sejam novas.

Assim, o Novembro de 2023 ficará manchado pelos falsos moderados que atacaram e rotularam de radicais o partido fundador da democracia.

Entretanto, e porque não poderia deixar de ser, fica o repto: tal como foi tão bem-vinda a presença de alguns no 25 de Novembro, conseguirá Carlos Moedas descer a Avenida no 25 de Abril? Lá o esperarei num dos dias maiores de Portugal, o dia da Liberdade.

Advogado, presidente da Assembleia da Freguesia de Marvila (PS)

DN
Manuel Portugal Lage
27 Novembro 2023 — 18:28


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115: O parágrafo mais longo da democracia contemporânea

 

🇵🇹 OPINIÃO

É inevitável abordar a situação política nacional. De uma maioria absoluta, cuja principal prioridade anunciada foi a estabilidade, no espaço de menos de uma semana o país recebeu a demissão de um Primeiro-Ministro, uma dissolução do Parlamento e a convocação de eleições para Março de 2024.

Várias são as teses do “como aqui chegámos e de como daqui vamos sair”, contudo não posso deixar de sublinhar alguns aspectos dos acontecimentos que assolaram a nação nos últimos dias. Assim, a primeira referência terá necessariamente de ir para António Costa.

Trata-se do político nacional com maior longevidade em funções. Dessa forma, e entre os cargos que desempenhou, foi o político que mais tempo teve a confiança dos portugueses. Honra lhe seja feita porque sempre afirmou ser um institucionalista, ou seja, defender a instituição acima de si próprio.

Costa nunca deixou de ser ou parecer sério. No primeiro dia em que essa seriedade foi colocada em causa, a sua opção imediata foi agir em conformidade com o que sempre defendeu.

Portugal despede-se de um Primeiro-Ministro que liderou o país em vários momentos difíceis e que o credibilizou junto dos seus parceiros europeus. Fê-lo em muitos momentos, mas especialmente através da sua participação no Conselho da Europa e junto dos restantes países da lusofonia.

Perante este contexto preocupante, a oposição não demorou a fantasiar e a criar narrativas que tentam encontrar histórias tendenciosas e convenientes. Costa demitiu-se por imperativo de consciência e alinhamento total com aquilo que sempre acreditou e apregoou, mesmo que debaixo de um contexto rodeado de grande insipiência.

Tanto o Presidente da República como o Primeiro-Ministro agem em função do que sabem. E se é verdade que a Sr.ª Procuradora Geral da República esteve no Palácio de Belém, não é menos verdadeiro que perante a gravidade da situação a justiça necessite de fundamentar em público a hecatombe que criou.

A questão que urge fazer é a seguinte: perante a queda de um governo, e de um parlamento democraticamente eleito, não merecerá o país mais do que um parágrafo numa nota à comunicação social, e uma adenda dias depois?

Como advogado sou defensor do princípio da separação de poderes; como democrata seguro com firmeza a convicção da presunção da inocência, do ónus da prova e da independência do poder judicial. Deste modo, não se trata de defender o governo mas sim legitimar a actuação do Ministério Público perante os portugueses.

O segredo de justiça é importantíssimo, assim como a imparcialidade enquanto “manto” da soberania e sobriedade, mas quanto mais dúvidas permanecerem, mais haverá a perder em toda a linha.

E ainda que a justiça não deva actuar de forma diferente em função dos visados, há uma certeza: um parágrafo não é suficiente para justificar tamanha catástrofe governamental.

DN
Manuel Portugal Lage
13 Novembro 2023 — 15:15


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