80 blocos residenciais e 120 edifícios em Kiev ficaram sem electricidade e fragmento de um dos drones abatidos chegou a provocar um incêndio numa creche. Tudo aconteceu no dia mais sensível para os ucranianos.
Sergey Dolzhenko/Lusa Um dos apartamentos atingidos ao nascer do sol de Kiev, este sábado.
Kiev foi este sábado alvo do maior ataque de sempre com drones desde a invasão do país, segundo as autoridades ucranianas.
Vários edifícios de diversos bairros da capital foram atingidos por grandes explosões ao nascer do sol, provocadas por mais de 70 droneskamikaze Shahed.
Mais tarde, segundo a Reuters, a Força Aérea anunciou ter abatido 71 destes drones iranianos e um míssil. Não se sabe ao certo qual seria o alvo dos russos.
Cerca de 80 blocos residenciais e 120 edifícios em Kiev ficaram sem electricidade, após o ataque em massa, informaram as autoridades ucranianas.
One of the largest Geran-2 drone attacks of the war took place last night involving 40 drones. Most of which were seen over the Kiev region. In total the attack lasted 8 hours. pic.twitter.com/t2ZlKGwzfX
Uma menina de 11 anos está entre as cinco pessoas que ficaram feridas devido aos ataques, confirmou o Presidente da Câmara de Kiev, Vitali Klitschko em mensagem no Telegram. Um fragmento de um dos drones abatidos chegou a provocar um incêndio numa creche.
“O inimigo continua a espalhar o terror”, acrescentou.
“Matar pela fome”. “É impossível esquecer”
Tudo aconteceu num dia sensível para os ucranianos. Assinala-se, no quarto sábado de Novembro, o dia da maior tragédia nacional, o Holodomor, de 1932-33.
A data lembra o genocídio por fome que ocorreu na Ucrânia Soviética durante o regime de Josef Stalin na União Soviética. Estima-se que milhões de ucranianos morreram devido à fome, provocada por políticas soviéticas. O termo “Holodomor” significa literalmente “matar pela fome” em ucraniano.
“Terror intencional…os dirigentes russos orgulham-se do facto de poderem matar”, lamentou o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky.
A Ucrânia, conhecida como o “celeiro da Europa”, saiu seriamente afectada pelas políticas de colectivização agrícola de Stalin, destinadas a integrar a agricultura individual em fazendas colectivas, como a requisição forçada de grãos e outros alimentos, deixando os agricultores sem suficiente para sobreviver.
Sobre a efeméride, Zelensky afirmou ser “impossível” perdoar os “crimes de genocídio” cometidos pelos soviéticos durante a era de Estaline contra os ucranianos durante a grande fome dos anos 30.
“É impossível esquecer, compreender e, acima de tudo, perdoar os horríveis crimes de genocídio que os ucranianos sofreram no século XX”, declarou num comunicado à imprensa no dia da comemoração da fome de 1932-1933.
Ataques causaram a morte a pelo menos quatro pessoas. Organização denunciou que a ofensiva russa coloca em risco a vida de quem presta cuidados de saúde e a sua própria capacidade de prestar assistência.
A organização não-governamental Médicos Sem Fronteiras (MSF) denunciou esta sexta-feira a realização de ataques russos a dois hospitais ucranianos nas regiões de Donetsk e Kherson, que causaram a morte a pelo menos quatro pessoas.
Devido a estes ataques, a organização viu-se obrigada a suspender temporariamente a sua presença nestes dois hospitais, mas assegurou que continua a trabalhar em outros centros sanitários da região.
Trabalhadores da organização estavam presentes nos dois hospitais, mas não ficaram feridos.
A MSF denunciou que a ofensiva russa coloca em risco a vida de quem presta cuidados de saúde e a sua própria capacidade de prestar assistência.
O mais recente ataque, realizado na segunda-feira, foi dirigido ao hospital de Selidovo, em Donetsk, onde as autoridades ucranianas confirmaram a morte de três pessoas. Nas instalações hospitalares encontravam-se cinco funcionários da MSF, avançou esta, em comunicado.
Segundo relatou Artem Tretiakov, condutor de ambulâncias da MSF, as explosões começaram a ouvir-se cerca da meia-noite, “mas foram-se ouvindo cada vez mais perto”.
De repente, recordou, “um míssil atingiu (…) o edifício”.
Em consequência, o hospital de Selidovo sofreu graves estragos, bem como duas ambulâncias da MSF, que integram um sistema destes veículos que já transportou mais de 10.600 pessoas, desde maio de 2022, pouco depois do início da invasão russa da Ucrânia.
Além do ataque em Donetsk, a MSF recordou que na segunda-feira anterior os militares russos tinham atacado outro hospital, em Kherson, onde a MSF também está presente, que causou a morte a uma pessoa e ferimentos em três.
“Condenamos energicamente estes ataques abomináveis a hospitais, que causaram trágicas mortes e ferimento a doentes e pessoal médico (..). Supõe-se que as instalações médicas são lugares onde se salvam vidas, não onde se perdem”, afirmou o coordenador-geral da MSF na Ucrânia, Vincenzo Porpiglia.
A Médicos Sem Fronteiras colabora com o serviço de urgências e cuidados intensivos do hospital de Selidovo desde Julho último, enquanto no hospital de Kherson está presente desde Outubro.
A ofensiva militar lançada a 24 de Fevereiro de 2022 pela Rússia na Ucrânia causou, de acordo com os mais recentes dados da ONU, a pior crise de refugiados na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
A invasão russa — justificada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, com a necessidade de “desnazificar” e desmilitarizar a Ucrânia para segurança da Rússia – foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que tem respondido com envio de armamento para a Ucrânia e imposição à Rússia de sanções políticas e económicas.
O `site` do ministério diz que Kasyanov “participou na criação e divulgação de mensagens e materiais de agentes estrangeiros para um círculo ilimitado de pessoas, disseminou informações falsas sobre as decisões tomadas pelas autoridades públicas da Federação Russa e as políticas seguidas” e “opôs-se à operação militar especial na Ucrânia”.
Kasianov é também acusado pelo Ministério da Justiça de ser membro do Comité Anti-Guerra Russo, uma associação cujas actividades visam “desacreditar a política externa e interna russa”.
Kasyanov tornou-se primeiro-ministro em 2000, depois de Putin ter sido eleito para a presidência, e serviu como chefe do Governo até 2004, quando foi demitido, tendo sido o principal responsável por varias reformas económicas.
Tornou-se uma figura proeminente da oposição depois de deixar o cargo e tentou concorrer à presidência em 2008, mas a sua candidatura foi rejeitada pela comissão eleitoral nacional.
Quando Putin enviou tropas para a Ucrânia, em Fevereiro de 2022, Kasyanov deixou o país e deverá estar agora a viver na Letónia.
Em Junho de 2022, afirmou, em declarações à agência francesa de notícias AFP, que já não reconhecia o Vladimir Putin com quem tinha trabalhado, admitindo esperar que um dia a Rússia regresse a um “caminho democrático”.
O estatuto de “agente estrangeiro” impõe pesadas restrições administrativas às pessoas ou entidades em causa, incluindo a monitorização regular das suas fontes de financiamento, e exige que qualquer publicação, inclusive nas redes sociais, seja acompanhada do rótulo “agente estrangeiro”.
O poder russo intensificou a repressão a qualquer voz dissidente desde o lançamento da ofensiva contra a Ucrânia, sendo que quase todos os principais opositores estão na prisão ou exilados no estrangeiro.
A crise de 25 de Novembro de 1975 é um dos episódios mais controversos da história recente portuguesa. Esquerda e direita mantêm divergências quanto ao que aconteceu de facto nessa altura, e quanto à comemoração ou não da data.
Pedro Ribeiro Simões / Flickr Vasco Lourenço, capitão de Abril
A Câmara Municipal de Lisboa (CML) vai assinalar os 48 anos do 25 de Novembro de 1975 com várias iniciativas na cidade. Isto apesar de os partidos da oposição no município terem votado contra a ideia do presidente Carlos Moedas.
O autarca defende a celebração notando que o 25 de Abril de 1974 pôs fim à ditadura do Estado Novo, mas sublinha que “só em Novembro se cumpriu Abril”.
Moedas salienta ainda que “há datas que temos a obrigação ética e social de não esquecer”, “a bem da democracia e da liberdade”, e “a bem das novas gerações”.
A Iniciativa Liberal (IL) também vai assinalar a data durante a 6.ª edição da Festa da Liberdade, um jantar comício que decorre sábado, no Porto. O presidente do partido, Rui Rocha, assinala que a IL “é o único partido que celebra com igual entusiasmo o 25 de Novembro e o 25 de Abril”.
O também deputado da IL salienta que quer “dar um sinal de que Portugal não é sequestrável pelo radicalismo de esquerda“.
“Partidos como o PS, que sempre tiveram esta data também como uma data fundadora da democracia, neste momento, estão envergonhados ou mesmo retirados da celebração do 25 de Novembro, quando isso é uma data fundamental na própria história do PS”, critica ainda Rui Rocha.
O presidente da IL também se atira aos “partidos radicais de esquerda, o PCP e o Bloco de Esquerda”, notando que “não reconhecem a importância do 25 de Novembro” e que “têm mesmo uma posição contrária aos valores” da data.
“Sem Novembro nunca se teria cumprido Abril. O 25 de Abril derrubou uma ditadura, o 25 de Novembro impediu que fosse imposta outra ditadura aos portugueses”, aponta ainda a IL em comunicado.
O que aconteceu a 25 de Novembro de 1975
Este é um dos episódios mais controversos da história recente portuguesa. O país esteve “muito próximo da guerra civil”, como assegura, em declarações ao podcast do Expresso “A história repete-se”, o coronel Vasco Lourenço que viveu aqueles dias tensos marcados por um ambiente de alta tensão no seguimento da Revolução do 25 de Abril.
O então Presidente da República, General Francisco Costa Gomes, decretou o estado de sítio nesse 25 de Novembro fatídico de 1975.
Num clima de grande instabilidade governativa, “havia provocações permanentes” entre direita e esquerda, conta Vasco Lourenço, recordando que houve vários episódios tensos, nomeadamente com a “Assembleia Constituinte cercada” e a “greve do Governo” que suspendeu funções.
Em pleno PREC (Processo Revolucionário em Curso), os militares mantinham um grande peso no equilíbrio de poder num ambiente de radicalização e de crescentes divergências entre PCP e PS, com Mário Soares a acusar os comunistas de quererem “controlar o processo político”.
À direita, os partidos queriam proibir o PCP.
A nomeação de Vasco Lourenço, visto como um moderado, para o comando da Região Militar de Lisboa, em substituição de Otelo Saraiva de Carvalho, numa tentativa de controlar os militares desta região, terá sido a faísca que despoletou a revolta no seio das Forças Armadas, onde havia várias facções em divergência.
Vasco Lourenço identifica várias “tendências” dentro do MFA [Movimento das Forças Armadas] e nota que até o “Grupo dos Nove” de que fazia parte, e que foi essencial na crise do 25 de Novembro, se dividia em diferentes correntes.
Havia os que defendiam “a continuação do 25 de Abril e a aprovação da Constituição”, mas também os que queriam uma “democracia musculada que era o sector spínolista” e a extrema-direita, nota.
Assim, neste clima de divergências, na manhã de 25 de Novembro, para-quedistas com ligações à extrema-esquerda ocuparam quatro bases da Força Aérea e o Comando Operacional em Monsanto, o que despoletou movimentações militares e civis.
O “Grupo dos Nove”, constituído por membros do Conselho da Revolução, designadamente Vasco Lourenço, Costa Neves e Melo Antunes, esteve na linha da frente da intervenção, contando com o apoio dos Comandos, e conseguiu conter as acções de revolta militar.
Os para-quedistas acabaram por “render-se” a 28 de Novembro de 1975.
Estes são, em termos genéricos, os factos. Mas a interpretação do que aconteceu, nomeadamente em termos de guerra de bastidores, diverge.
“Uma revolução pactuada entre PCP e MFA”
O historiador Fernando Rosas que esteve ligado ao PCP e ao Bloco de Esquerda considera que o 25 de Novembro foi “uma revolução pactuada sobretudo entre o PCP e o Grupo dos Nove, do MFA, ou seja, entre o Álvaro Cunhal e o Melo Antunes“, conforme sublinhava numa entrevista em maio deste ano ao podcast “Avenida da Liberdade” da Rádio Renascença.
“O país ficou virado de pernas para o ar”, mas não foi “bem uma contra-revolução”, analisava Rosas, salientando que “as conquistas revolucionárias fundamentais” foram “consagradas na Constituição de 1976”.
Houve “dois derrotados” no 25 de Novembro
Na análise de José Pacheco Pereira, também historiador, comentador político e ex-dirigente do PSD, houve “dois derrotados” no 25 de Novembro, “a extrema-esquerda militar” e os que queriam “proibir o PCP”.
“Em ambos os casos, quer uns quer outros, se ganhassem, podiam no limite abrir caminho para uma guerra civil, e a democracia ficaria em causa por muitos anos“, salienta Pacheco Pereira num artigo de opinião no Público.
“É a derrota das duas tentativas que torna o 25 de Novembro importante”, reforça, sublinhando que “apresentar o PCP como o “grande derrotado” do 25 de Novembro não tem qualquer fundamento”. “Ficou enfraquecido, mas ministros comunistas continuaram no Governo e algumas políticas de nacionalizações são posteriores ao 25 de Novembro”, realça.
Pacheco Pereira também fala dos riscos das comemorações do 25 de Novembro poderem ser usadas para “introduzir nos dias de hoje uma espécie de remake dos riscos de guerra civil do passado”.
E reforça que “os desejos de guerra civil em 1975 não vieram só de um lado, vieram dos dois, à direita e à esquerda”, e “ambos fizeram danos à democracia e ambos mataram”, conclui.
Zelensky acredita que a Rússia está a incitar uma nova guerra entre a Sérvia e o Kosovo para distrair as atenções do conflito ucraniano.
Vladimir Putin está a preparar uma nova guerra na Europa para roubar as atenções do conflito na Ucrânia. A acusação foi feita por Volodymyr Zelensky esta quinta-feira, que acusa ainda a Rússia e o Irão de estarem por trás da recente escalada de violência entre Israel e o Hamas.
“Hoje, todos estão a discutir a crise no Médio Oriente. Mas, como eu disse antes, francamente, não é um problema de ontem. Todos sabem desse conflito constante e da guerra constante, mas ninguém quer acabar com isso porque é conveniente. Por trás da ‘explosão’ no Médio Oriente está a Rússia, temos a certeza, com o seu aliado Irão”, acusa Zelensky, citado pela Newsweek.
O responsável ucraniano acredita que os Balcãs serão o próximo alvo do Kremlin. “As relações nos Balcãs estão em crise há muito tempo. A Rússia vai investir para garantir que um país entrará em guerra com outro. Pelo menos se os países do mundo não fizerem nada agora, então haverá outra ‘explosão’ e, mais uma vez, esta não é uma história nova”, alerta.
Nas últimas semanas, a tensão entre a Sérvia e o Kosovo tem subido, com relatos dos piores episódios de violência desde o fim da guerra em 1999. Em Abril de 2022, o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais avisou ainda que Moscovo pode tentar alimentar a tensão nos Balcãs para desviar a atenção da sua “campanha falhada” na Ucrânia.
O chefe de Estado ucraniano falou ainda da Moldova, onde os russos “estão a começar a agitar a situação” e querem “demolir” o Governo mais próximo da Europa. Zelensky acredita que o objectivo do Kremlin é dividir a atenção e apoio do Ocidente em vários países.
Anteriormente, Zelensky já tinha dito que a Rússia estava a ponderar vários cenários para o futuro do conflito na Ucrânia. Na terceira cimeira da Comunidade Política Europeia (CPE) em Granada, Espanha, a 5 de Outubro, o chefe de Estado disse que um desses cenários é congelar a guerra e restaurar o seu potencial militar, com 2028 a tornar-se potencialmente um momento crítico.
“A Rússia terá então poder suficiente para atacar os países que estão no foco da sua expansão. Além da Ucrânia, estes são definitivamente os Estados Bálticos e os países onde as tropas russas estão presentes”, disse Zelensky.
O governo chinês criou a maior operação de desinformação online do mundo e está a utilizá-la para assediar residentes, políticos e empresas dos EUA – por vezes ameaçando os seus alvos com violência, segundo uma análise da CNN de documentos judiciais e revelações públicas de empresas de redes sociais.
A investida de ataques – muitas vezes de natureza vil e profundamente pessoal – faz parte de uma campanha do governo chinês de intimidação, bem organizada e cada vez mais descarada, dirigida a pessoas nos Estados Unidos, segundo os documentos.
O Departamento de Estado dos EUA afirma que as tácticas fazem parte de um esforço multimilionário mais amplo para moldar o ambiente de informação do mundo e silenciar os críticos de Pequim, que se expandiu sob o presidente Xi Jinping. Na quarta-feira, o Presidente Biden deverá encontrar-se com Xi numa cimeira em São Francisco.
As vítimas enfrentam um bombardeamento de dezenas de milhares de publicações nas redes sociais que os chamam de traidores, cães e insultos racistas e homofóbicos. Dizem que tudo isto faz parte de um esforço para as levar a um estado de medo e paranóia constantes.
Muitas vezes, estas vítimas não sabem para onde se virar. Algumas falaram com as autoridades policiais, incluindo o FBI – mas pouco foi feito. Embora as empresas tecnológicas e de redes sociais tenham encerrado milhares de contas dirigidas a estas vítimas, são ultrapassadas por uma série de novas contas que surgem praticamente todos os dias.
Conhecida como “Spamouflage” ou “Dragonbridge”, a rede de centenas de milhares de contas espalhadas por todas as principais plataformas de redes sociais não só assediou americanos que criticaram o Partido Comunista Chinês, como também procurou desacreditar políticos dos EUA, denegrir empresas americanas em desacordo com os interesses da China e sequestrar conversas online em todo o mundo que pudessem retratar o PCC de forma negativa.
Investigadores privados têm seguido a rede desde a sua descoberta há mais de quatro anos, mas só nos últimos meses é que os procuradores federais e a empresa-mãe do Facebook, a Meta, concluíram publicamente que a operação tem ligações à polícia chinesa.
A Meta anunciou em Agosto que tinha retirado um conjunto de quase 8.000 contas atribuídas a este grupo só no segundo trimestre de 2023. A Google, que detém o YouTube, disse à CNN que tinha encerrado mais de 100 mil contas associadas nos últimos anos, enquanto o X, anteriormente conhecido como Twitter, bloqueou centenas de milhares de contas chinesas “apoiadas pelo Estado” ou “ligadas ao Estado”, de acordo com blogues da empresa.
Ainda assim, dado o custo relativamente baixo de tais operações, os especialistas que monitorizam a desinformação alertam para o facto de o governo chinês continuar a utilizar estas tácticas para tentar aproximar as discussões online da narrativa preferida do PCC, o que frequentemente implica tentar minar os EUA e os valores democráticos.
“Podemos pensar que isto se limita a certas salas de conversação, ou a esta ou àquela plataforma, mas está a expandir-se por todo o lado”, disse à CNN o deputado Mike Gallagher, presidente da Comissão de Selecção da Câmara norte-americana sobre o PCC.
“E é apenas uma questão de tempo até que isso aconteça com o cidadão americano médio que não acha que isso seja um problema seu no momento”.
“Trollar” para ganhar a vida
Quando os trolls interromperam um evento Zoom anti-comunista organizado pelo activista Chen Pokong, baseado em Nova Iorque, em Janeiro de 2021, ele não teve muitas dúvidas sobre quem era o responsável.
Os trolls zombaram dos participantes e ameaçaram uma das vítimas, dizendo que ela iria “morrer miseravelmente”. A sua conduta fez Chen recordar a repressão do governo da China, onde passou quase cinco anos na prisão por trabalho pró-democracia.
Mas as suas suspeitas sobre quem estava por detrás da interrupção solidificaram-se quando o Departamento de Justiça dos EUA acusou mais de 30 funcionários oficiais chineses no início deste ano de dirigirem uma vasta operação de desinformação que tinha como alvo dissidentes nos EUA, incluindo os da reunião Zoom que Chen diz ter organizado em 2021.
Foi apenas uma das várias acusações que o Departamento de Justiça divulgou em Abril, expondo supostas conspirações do governo chinês para atingir seus supostos críticos e inimigos, enquanto impugna a soberania dos Estados Unidos.
Dois alegados agentes chineses foram acusados de gerir uma “esquadra de polícia não declarada” na cidade de Nova Iorque. No ano passado, uma outra acusação descreveu a forma como os agentes chineses alegadamente tentaram fazer descarrilar a campanha para o Congresso de um dissidente chinês.
“Querem privar-me da minha liberdade de expressão, pelo que sinto que não se trata apenas de um ataque contra mim”, disse Chen, que foi expulso da sua própria reunião durante a perturbação. “Eles também atacam a América”.
A queixa do Departamento de Justiça dos EUA nomeou 34 funcionários do Ministério da Segurança Pública da China e publicou fotografias deles em computadores, alegadamente a trabalhar na campanha de desinformação conhecida como “Grupo de Trabalho do Projecto Especial 912”.
A operação, baseada principalmente em Pequim, parece envolver “centenas” de funcionários do MPS em todo o país, de acordo com o depoimento de um agente do FBI.
A queixa não se refere ao conjunto de contas falsas como “Spamouflage”, mas investigadores privados e um porta-voz da Meta disseram à CNN que a actividade nas redes sociais descrita pelo Departamento de Justiça faz parte dessa rede.
Como parte de uma missão “para manipular as percepções públicas da [China], o Grupo usa as suas contas de redes sociais mal atribuídas para ameaçar, assediar e intimidar vítimas específicas”, afirma a queixa.
Quando questionado sobre as alegadas ligações do Spamouflage às forças da lei chinesas, o porta-voz da embaixada da China em Washington, Liu Pengyu, negou as alegações.
“A China respeita sempre a soberania dos outros países. A acusação dos EUA não tem qualquer prova factual ou base legal. É inteiramente motivada por razões políticas. A China opõe-se firmemente a ela”, afirmou Liu numa declaração à CNN. E afirmou que os EUA “inventaram o armamento do espaço de informação global”.
Um relatório publicado pela Meta em Agosto ilustra a forma como as mensagens da rede se alinham frequentemente com as horas do dia de trabalho na China. O relatório descrevia “explosões de actividade a meio da manhã e ao início da tarde, hora de Pequim, com pausas para almoço e jantar, e depois uma explosão final de actividade à noite”.
E, embora a Meta tenha detectado mensagens de várias regiões da China, a empresa e outros investigadores descobriram uma coordenação centralizada que enviava incessantemente mensagens idênticas através de várias plataformas de redes sociais, por vezes insultando repetidamente os mesmos indivíduos que questionaram o governo chinês.
Um desses indivíduos é Jiayang Fan, jornalista da The New Yorker que disse à CNN que começou a enfrentar o assédio da rede quando cobriu os protestos pró-democracia em Hong Kong em 2019.
Os ataques dirigidos a Fan – que variaram de desenhos animados dela a pintar o rosto de branco, como se rejeitasse a sua identidade, a acusações de que ela matou a sua mãe para obter lucros – carregam sinais reveladores da rede Spamouflage, disse Darren Linvill, do Media Forensics Hub da Clemson University. O grupo de Linvill encontrou mais de 12 mil tweets a atacar Fan usando a mesma hashtag, #TraitorJiayangFan.
Apesar de não viver na China desde criança, Fan acredita que tais mensagens foram lançadas contra ela para provocar medo e silenciar os outros.
“Isto faz parte de um manual muito antigo do Partido Comunista Chinês para intimidar os infractores e os aspirantes a infractores”, afirmou Fan, que se questiona sobre o que poderão pensar os seus familiares distantes na China quando virem este tipo de conteúdo. “É desconfortável para mim saber que eles estão a ver estas representações de mim e não fazem ideia do que acreditar.”
Tácticas em evolução
Os peritos que acompanham as campanhas de influência online dizem que há sinais de uma mudança na estratégia da China nos últimos anos. No passado, a rede Spamouflage centrava-se sobretudo em questões internas relevantes para a China.
No entanto, mais recentemente, as contas ligadas ao grupo têm alimentado a controvérsia em torno de questões globais, incluindo os desenvolvimentos nos Estados Unidos.
As contas do Spamouflage – algumas das quais se faziam passar por residentes do Texas – apelaram a protestos contra os planos de construção de uma instalação de processamento de terras raras no Texas e espalharam mensagens negativas sobre uma outra empresa de fabrico norte-americana, segundo um relatório da empresa de cibersegurança Mandiant do ano passado.
O relatório também descreveu a forma como a campanha promoveu conteúdos negativos sobre os esforços da administração Biden para acelerar a produção de minerais que reduziriam a dependência dos EUA em relação à China.
Outros posts da rede referiam que “o racismo é uma vergonha indelével para a democracia americana” e que os EUA cometeram “genocídio cultural contra os índios”, de acordo com um relatório da Meta em Agosto. Outro post afirmava que a antiga Presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, está “cheia de escândalos”.
“O spamouflage está “a evoluir nas tácticas. Está a evoluir em termos de temas”. Ben Nimmo, líder global de informações sobre ameaças na Meta
Contas ligadas ao governo chinês também publicaram mensagens que incluíam um apelo para “matar” o presidente Biden, um desenho animado com o chamado QAnon Shaman que se revoltou no Capitólio dos EUA como um símbolo da “democracia de estilo ocidental” e uma publicação que sugeria que as empresas privadas de defesa dos EUA iriam lucrar com a morte de pessoas inocentes, de acordo com um relatório do Departamento de Segurança Interna em Abril obtido por solicitação de registos.
A queixa apresentada pelo Departamento de Justiça contra os funcionários chineses alegava que, no ano passado, estes tentaram tirar partido do segundo aniversário da morte de George Floyd e publicar nas redes sociais sobre o seu assassínio para “revelar a brutalidade da aplicação da lei” nos EUA. Também receberam uma tarefa para “trabalhar nas eleições intercalares de 2022 nos EUA e criticar a democracia americana”.
O Spamouflage está “a evoluir em termos de tácticas. Está a evoluir em termos de temas”, disse Ben Nimmo, o líder global da inteligência de ameaças da Meta. “O nosso trabalho é continuar a aumentar as nossas defesas e continuar a informar as pessoas sobre isto, especialmente à medida que nos aproximamos do ano eleitoral”.
No entanto, à medida que as empresas de redes sociais se esforçam por travar a desinformação e o governo dos EUA apresenta queixas contra os alegados responsáveis, a responsabilização pode ser ilusória.
“É este o problema de muitos crimes cibernéticos, que se torna muito, muito difícil colocar os autores na cadeia”, disse Lindsay Gorman, chefe de tecnologia e geopolítica da Aliança para a Segurança da Democracia do Fundo Marshall Alemão.
Mas, acrescentou Gorman, isso não significa que não haja consequências para a China.
“Mesmo que os indivíduos tenham um certo grau de impunidade porque nunca planearam vir para os Estados Unidos, isso não significa que a operação do partido tenha impunidade aqui – certamente não em termos de opinião pública, certamente não em termos de relações EUA-China”, disse ela.
Inundação das redes sociais
A Meta, a Google e outras empresas que publicaram relatórios sobre o Spamouflage sublinham que a maioria das contas das redes sociais dentro da rede recebem pouco ou nenhum envolvimento, o que significa que raramente se tornam virais.
Mas Linvill, da Universidade de Clemson, argumenta que a rede utiliza uma estratégia única de “inundar” as conversas com tantos comentários que as mensagens de utilizadores genuínos recebem menos atenção. Isto inclui a publicação em plataformas normalmente não associadas à desinformação, como o Pinterest.
“Eles operam milhares de contas ao mesmo tempo numa determinada plataforma, muitas vezes para abafar as conversas, apenas com o grande volume de mensagens”, disse Linvill.
“Quando pensamos em desinformação, muitas vezes pensamos em empurrar ideias para os utilizadores e torná-las mais salientes, enquanto o que a China está a fazer é o oposto. Eles estão tentando remover as conversas das redes sociais.
Quando Pequim sediou os Jogos Olímpicos de inverno de 2022, por exemplo, grupos de direitos humanos começaram a promover a hashtag #GenocideGames para chamar a atenção para as acusações de que a China deteve mais de um milhão de uigures e outras minorias muçulmanas em campos de internamento.
Mas depois aconteceu algo surpreendente. Contas que Linvill e os seus colegas acreditavam fazer parte do Spamouflage começaram também a tweetar a hashtag.
Poderia ser contra-intuitivo para um grupo pró-governo chinês começar a espalhar uma hashtag que chamava a atenção para os abusos dos direitos humanos do governo chinês, explicou Linvill.
Mas ao usar a hashtag repetidamente em tweets que não tinham nada a ver com o assunto em si, o Spamouflage conseguiu reduzir as visualizações das mensagens legítimas.
Jiajun Qiu, cujo trabalho académico se centra nas eleições e que fugiu da China em 2016, mostrou à CNN o que acontece quando escreve o seu nome no X, anteriormente conhecido como Twitter. Por vezes, há dezenas de contas que se fazem passar por ele, utilizando o seu nome e a sua fotografia.
Os operadores do Spamouflage, explicou Linvill, criaram estes trolls para confundir as pessoas e impedir que encontrem a conta verdadeira de Qiu, baralhando as águas.
Actualmente a viver na Virgínia, Qiu gere um canal pró-democracia no YouTube e tem enfrentado um ataque de insultos homofóbicos, racistas e bizarros de contas de redes sociais que a equipa de Linvill e outros associaram ao Spamouflage.
Algumas contas publicaram desenhos animados que apresentam Qiu como um insecto que trabalha para o governo dos EUA. Outra imagem mostra-o a ser espezinhado por um Jesus dos desenhos animados. Outra ainda pinta-o como um cão à trela de um rato americano.
“Eu digo a verdade às pessoas, por isso elas querem fazer tudo o que for possível para me insultar”, disse Qiu.
Linvill e a sua equipa localizaram centenas destes desenhos animados na Internet e afirmam que são um “sinal” do Spamouflage. Os cartoons, explicou Linvill, podem ser mais eficazes do que o texto porque são “apelativos” e “é preciso parar e olhar para eles”.
Além disso, estes desenhos animados originais podem ser facilmente traduzidos para centenas de línguas a um custo muito baixo.
Além das difamações online, Qiu diz que também foi alvo de ameaças através de outras mensagens em linha e de telefonemas de fontes não identificadas que acredita terem ligações ao governo chinês.
Uma mensagem anónima dizia-lhe que seria preso e levado à justiça por violar a lei chinesa. Um e-mail fazia referência à igreja que frequenta em Manassas, Virgínia, e dizia que “para sua própria segurança e a dos fiéis, ele faria bem em encontrar outro lugar para ficar”.
Qiu disse à CNN que o FBI o interrogou quatro vezes sobre estas ameaças e que recebeu instruções para contactar a polícia local se alguma vez for seguido.