69: Orçamento de unidade em tempos de crise

 

🇵🇹 OPINIÃO

São virtudes do Orçamento do Estado para 2024 (OE2024) a previsão de excedente de 0,2% do Produto Interno Bruto (PIB) – depois do recorde deste ano – e fixar a dívida pública abaixo dos 100%.

Estas eram metas ambiciosas de Fernando Medina num cenário de continuidade deste Governo. Só que agora todo o orçamento está em suspenso à espera do Presidente da República no pós-terramoto político que levou à demissão de António Costa, alvo de um inquérito-crime e após inéditas buscas em S. Bento, que culminaram com a detenção, entre outros, do chefe de gabinete do primeiro-ministro, na sequência de investigações conduzidas pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) aos negócios do lítio, do hidrogénio verde e de um data center.

O fim da Era Costa pode travar o polémico aumento do Imposto de Circulação Automóvel (IUC) para veículos anteriores a Julho de 2007.

Agradaria a muitos portugueses, se assim acontecesse. Mas há medidas igualmente em risco, que já criaram expectativas positivas nas famílias com o cinto demasiado apertado há muito tempo: a redução do IRS, os aumentos dos salários da Função Pública e do salário mínimo, por exemplo, que devolveriam algum poder de compra aos portugueses – apesar de que a subida dos impostos indirectos acabaria por tirar com uma mão o que a outra daria, em parte; e os apoios sociais e apoios às rendas que não chegariam às famílias mais vulneráveis atirariam muitos para situações de maior fragilidade social.

Em tempo de crise governativa, podem-se questionar medidas orçamentais em avulso, mas a ausência de apoio num momento difícil para quem não consegue pagar as contas todas no final do mês, poderia ter consequências arrasadoras.

Apesar de defender a necessidade de eleições legislativas, não é só o líder do maior partido da oposição, o social-democrata Luís Montenegro, que resguarda um orçamento do PS – que já foi aprovado na generalidade, mas falta ainda discutir e aprovar no Parlamento na especialidade -, para entrar em vigor a 1 de Janeiro próximo. Se assim não acontecer, voltaremos ao regime de duodécimos vivido em 2022, até Julho.

O Chega e o PS estão no mesmo diapasão, pelo menos, em relação à aprovação do OE2024, antes de uma possível dissolução da Assembleia da República – embora no caso dos socialistas se defenda que a ida às urnas não é a melhor solução, Carlos César diz que se houver eleições antecipadas “é muito importante ter um Orçamento aprovado” antes. Mas caberá ao Presidente decidir hoje, depois de ouvir o Conselho de Estado.

De uma maneira ou de outra, iremos ainda assistir a um novo capítulo na discussão sobre o que fazer com os saldos positivos das contas públicas.

Subdirector do Diário de Notícias

DN
Bruno Contreiras Mateus
09 Novembro 2023 — 00:39


Ex-Combatente da Guerra do Ultramar, Web-designer,
Investigator, Astronomer and Digital Content Creator

published in: 4 semanas ago

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49: A espremer a reforma de crise em crise

 

🇵🇹 OPINIÃO

O apertar do cinto para muitas famílias, com a subida do custo de vida à boleia da inflação e das taxas de juro Euribor, desde meados de 2022, associadas ao crédito à habitação, levou a uma taxa de poupança historicamente baixa – de apenas 5,7%, quando a média europeia está nos 14,8%. O recurso ao dinheiro amealhado para pagar as despesas mais correntes familiares tornou-se necessário para evitar o acumular de dívidas.

E já não é de agora, aconteceu desde a troika à pandemia: muitos portugueses têm vindo a deitar a mão, como último recurso, à poupança que têm para a reforma.

Nos últimos nove meses, os Planos Poupança Reforma (PPR) captaram menos 34% em valor do que em igual período do ano passado e registou-se um aumento de 54% dos resgates dos PPR.

O regulador não revela os motivos para que se recorra a uma poupança de longo prazo para fazer face às despesas, mas esta corrida aos levantamentos seguramente é motivada pelos sucessivos aumentos brutais das taxas de juro do BCE para combater a inflação.

É bom recordar que o resgate antecipado do PPR, sem penalização – e porque há muitos portugueses que só têm este recurso para ajudar a pagar dívidas, já que os salários não aumentaram na mesma proporção -, é uma medida excepcional que permite usar esse dinheiro de uma de três formas: para amortizar parte do empréstimo da casa, para pagar prestações do crédito à habitação, ou para pagar despesas no limite de 480,43 euros. Só que esta solução tem um viés: desvirtua a natureza do PPR.

Num país de baixas pensões de reforma e onde a sustentabilidade da Segurança Social é “alarmante”, como apontou há dias o antigo ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, usar hoje uma poupança desta natureza, com o objectivo de longo prazo, compromete a velhice de muitos.

Como alerta a Deco Proteste, “ainda que, de forma imediata, tal parece ajudar as famílias, no longo prazo perde-se o mealheiro destinado à reforma”.

A Defesa do Consumidor propôs, a propósito do Dia Mundial da Poupança, a 31 de Outubro, que fosse criado um produto financeiro de curto prazo, que iria funcionar como almofada de emergência, com isenção de impostos sobre os juros.

Poderia ser esta ou outra solução, mas em períodos de crise, é bom que as famílias tenham produtos de poupança adequados às suas necessidades. Tem de haver maiores e melhores incentivos à poupança para não estarmos, de crise em crise, a espremer a reforma.

Subdirector do Diário de Notícias

DN
Bruno Contreiras Mateus
07 Novembro 2023 — 00:09


Ex-Combatente da Guerra do Ultramar, Web-designer,
Investigator, Astronomer and Digital Content Creator

published in: 4 semanas ago

 

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