404: Façam as vossas apostas

 

– Discordo da análise deste cronista dado que Portugal e os portugueses já tiveram governanças de esquerda (geringonça), de direita (PPD, CDS) e os resultados foram a merda que todos sabemos e sofremos. Enquanto existirem políticos que apenas se lembram dos portugueses na altura das eleições para lhes caçar o voto e puderem aspirar a poder e a tacho, não existem alternativas viáveis e profícuas na governança de Portugal. Não contribuo para este peditório.

🇵🇹 OPINIÃO

Pouco a pouco, no chamado espaço público, começa a ganhar forma a ideia de que só com uma frente de “Centro-Direita” sem o Chega é possível apear do poder o PS que, se a legislatura for até ao fim, terá governado mais de uma década.

Curiosamente, as duas vozes – admito que já sejam mais – que até agora ouvi a defender esta grande coligação são de dois antigos deputados e dirigentes do CDS, um dos partidos fundadores da democracia que desapareceu do Parlamento nas últimas legislativas.

A teoria é simples e explica-se em poucas palavras. PSD, Iniciativa Liberal e CDS juntos, com uma abertura aqui e ali a “reformistas de Esquerda” que queiram alinhar – deixar claro que o Chega fica de fora -, e está feita a “grande coligação” capaz de gerar uma alternativa ao PS. O PSD seria o líder desta federação e, só talvez desta forma, concentrando votos do espaço “não-socialista e de não-Esquerda”, o “Centro -Direita” poderia sonhar voltar a governar.

Nenhum dos que elaborou sobre esta teoria, no entanto, acredita que ela possa passar à prática antes das Europeias, vistas como um teste eleitoral, um termómetro, uma medição de forças e de votos, uma espécie de “vamos ver quanto vales” para que possa ser estabelecida uma correlação de forças na eventual futura frente de Centro-Direita.

Ao CDS, seria o melhor que lhe poderia acontecer. Voltaria a ter deputados eleitos, mesmo que a solução não resultasse num Governo, estaria de novo no hemiciclo e teria recuperado do trambolhão eleitoral do ano passado.

Dito e visto assim, parece apenas e só uma soma aritmética de votos, uma estratégia para derrotar o PS, uma chance de o “Centro-Direita” voltar ao poder.

Por outro lado, seria um desafio ao eleitorado do Chega. Com um apelo ao “voto útil”, ou seja, “se votas no Chega corres o risco de ter mais quatro anos de Governos do PS ou de uma geringonça 2.0”.

Uma grande frente de “Centro-Direita”, uma federação de partidos, uma aliança, uma coligação precisa de muito mais do que a soma dos votos dos vários partidos.

Mas o mas nesta questão não está nem na ideia, nem na táctica, nem na estratégia. Uma grande frente de “Centro-Direita”, uma federação de partidos, uma aliança, uma coligação precisa de muito mais do que a soma dos votos dos vários partidos. Precisa de um projecto, um programa, uma alternativa.

Precisa de soluções para os problemas reais dos portugueses; precisa de trazer esperança e confiança; precisa de convencer o eleitorado a acreditar que a mudança é possível, é desejável e capaz de fazer reformas que tornem a nossa vida melhor.

Construir uma alternativa a várias mãos implica longos meses de negociações e cedências prévias, convergências no essencial e confiança total entre as partes.

O PSD, como líder histórico e natural do “Centro-Direita”, terá de ser a locomotiva que puxa os demais. Terá o PSD essa vontade, capacidade e disponibilidade? E, se sim, quando? E como? Com que programa?

Nesta altura, o PS está cercado.

E o PSD encurralado.

O que decidirem, nos próximos meses, os líderes partidários, vai definir os anos seguintes de um país que parece não se envergonhar de ter mais de milhão e meio de cidadãos sem médico de família; de ter 4,4 milhões de pessoas que, sem apoios sociais, viveriam abaixo do limiar da pobreza; e que, mesmo com ajudas, ainda tem quase dois milhões de pobres. Muitos deles, trabalham.

Talvez valha a pena pensar nisto.

Jornalista

DN
Pedro Cruz
19 Setembro 2023 — 00:27


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372: Agora falo eu

 

– “… É certo que Cavaco Silva não disse, cara a cara, a António Costa, nem metade do que tinha andado a dizer e a escrever no espaço público nas semanas que antecederam a primeira parte da reunião“.

Característico dos cobardolas que falam pelas costas e não possuem 🍅🍅 suficientes para falarem cara a cara! O resto, é tudo conversa da treta e é mais uma cena circense apelidada de conselho de Estado. Basta ler o que a pasquinzada jornalística anda a propagandear da direita fascista, do PPD ao Chega, e está tudo explicado.

🇵🇹 OPINIÃO

Mais logo, os conselheiros de estado voltam a sentar-se à mesa que tem Marcelo na cabeceira. Mas, desta vez, não vão para falar. Vão apenas para ouvir.

Ouvir António Costa, que tinha um avião para apanhar em Julho e, por isso, acontece esta parte II de uma reunião que Marcelo quer que seja recordada e à qual quer dar importância.

Na primeira parte deste encontro do órgão consultivo do PR, falaram todos os conselheiros e, tirando uma ou outra excepção, os diagnósticos de como vai Portugal não foram nada simpáticos para o Governo.

É certo que Cavaco Silva não disse, cara a cara, a António Costa, nem metade do que tinha andado a dizer e a escrever no espaço público nas semanas que antecederam a primeira parte da reunião. Limitou-se, o antigo primeiro-ministro e Presidente a falar de contas, do orçamento, da despesa e da receita.

No mesmo caminho seguiu Miguel Cadilhe, antigo ministro das finanças de Cavaco, que arrasou os números do governo e explicou porque é que afinal as contas certas não são tão certas nem tão folgadas como diz o actual ministro das Finanças.

Daqui a pouco, o conselho de Estado vai ouvir António Costa, o penúltimo a falar. Será o tempo do primeiro-ministro poder fazer a sua defesa, explicar aos restantes conselheiros que rumo segue o governo, o que anda a fazer e o que pretende para o futuro breve, com a preparação do OE a ser trabalhada.

Por fim, Marcelo.

Marcelo já não quer nem precisa de ouvir mais nada. Aliás, já fez saber que já sabe o que vai dizer, que o discurso está escrito, que se foi “escrevendo sozinho” enquanto tirava notas das intervenções dos conselheiros.

Ou seja, o que Marcelo já disse é que, independentemente do que venha a dizer António Costa, as conclusões já estão tiradas. Marcelo quis que se soubesse que não precisa de ouvir António Costa para saber o que dirá.

A estratégia de desvalorização da intervenção de António Costa é apenas mais um episódio – na minha opinião, grave – do contrapoder que, desde maio passado, quando Galamba ficou no governo contra a vontade de Marcelo, o presidente está disposto a exercer nestes dois anos e meio que faltam para o fim do mandato e numa altura em que o espaço público já se agita com nomes e disponibilidades de presidenciáveis.

Além disso, além disto, Marcelo já ameaçou que esta coisa do Mais Habitação não fica assim. “A regulamentação terá de me vir parar às mãos”, disse, este fim de semana, o chefe de Estado, depois de lembrar, mais uma vez, que ele acha que o pacote não vai funcionar.

E lamentou não ter havido abertura do PS para um acordo – nem que fosse pequeno – com o PSD para que o programa se tornasse mais abrangente e «estrutural».

Marcelo vetou, o diploma vai voltar sem ser mexido, ele vai (ter de) promulgar e, depois, vai esperar que o documento regresse a Belém, já regulamentado.

A frente de batalha entre PR e PM está aberta, por mais que digam, um e outro, que cada um está a cumprir escrupulosamente o seu papel e que, um e outro, estão a actuar dentro das competências e atribuições que a constituição lhes confere.

Este é o conselho de Estado de Marcelo. Que marcou em maio, que lembrou frequentemente que era em Julho, que teve de interromper, que retoma agora.

Marcelo já tomou o pulso ao conselho. A questão é, agora, o que dirá o PR a fechar a reunião e, já agora, se os conselheiros reflectem de facto a sociedade portuguesa. Ou se, pelo contrário, a sala do conselho é apenas (mais) uma bolha.

Jornalista

DN
Pedro Cruz
05 Setembro 2023 — 00:29


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358: O jogo das cadeiras

 

– De todos os putativos nomes abaixo mencionados, para exercerem a próxima  Presidência da República Portuguesa, apenas o nome do Almirante Gouveia e Melo será o mais indicado em todos os aspectos. Os restantes nomes são tralha política gasta, sem qualquer valor para assumir esse cargo.

🇵🇹 OPINIÃO

Ganha o jogo quem ficar sentado no final. A cada ronda, há sempre menos uma cadeira. E há sempre um candidato eliminado. O jogador que fica de pé e não consegue, a tempo, um lugar na cadeira, acaba eliminado.

Ao falar do tema das presidenciais e ao assumir, finalmente, que pode ser candidato a Belém, Marques Mendes sabe exactamente o que está a fazer.

Faltam dois anos e meio e, nestas coisas de candidaturas a Belém, os tabus não são bons conselheiros. Desta vez, a Direita deveria fazer uma espécie de primárias, que não existem em Portugal.

Ou, então, um jogo das cadeiras. Se houve alturas na história em que, na área de não esquerda, eram escassos os presidenciáveis, este é um momento em que acontece exactamente o contrário.

Marques Mendes, Durão Barroso, Pedro Passos Coelho, Paulo Portas e Pedro Santana Lopes são os putativos candidatos, uma mão-cheia de possibilidades para quem não quer votar nas várias esquerdas.

Mendes parte à frente e com vantagem – quando chegar a eleição, estará há mais de uma década no horário nobre, aos domingos (quando é que já vimos isto e o que aconteceu ao outro senhor que esteve mais de uma década no horário nobre aos domingos), com uma legião de seguidores cujas audiências demonstram que são fiéis.

Aliás, a putativa candidatura de Marques Mendes é o segredo mais mal guardado da política portuguesa. Na universidade de verão, ao assumir pela primeira vez que essa candidatura pode acontecer, Mendes deu o tiro de partida.

Pode ser um tema, como diria António Costa, que “não interessa” aos portugueses. Mas decerto que é um tema que não vai sair da actualidade. Marques Mendes tomou a iniciativa e com isso obriga os outros potenciais candidatos a saírem da toca ou, em alternativa, a criarem tabus.

Não seria um mau exercício de cidadania e de experiência social se a Direita fizesse mesmo umas primárias para as próximas presidenciais..

Não seria um mau exercício de cidadania e de experiência social se a Direita fizesse mesmo umas primárias para as próximas presidenciais. Claro que os proto-candidatos vão deixar que esse trabalho de eliminação e de probabilidades de eleição acabe por ser feito pelas sondagens e pelas indicações que forem dando.

Mas seria clarificador se, todos os que pensaram em ser candidatos, se assumissem e, depois disso, que se sujeitassem a um escrutínio prévio dos cidadãos. Não o farão, mas era uma forma interessante e clara de encontrar um candidato. Como acontece, por exemplo, nos Estados Unidos.

Talvez Durão Barroso não esteja para se maçar com uma candidatura; talvez Pedro Passos Coelho não tenha nem vontade, nem perfil para Belém, embora muitos gostassem de o ver lá.

Talvez Portas chegue à conclusão de que não ganharia essa eleição e talvez Pedro Santana Lopes, apesar da vontade e do desejo, entenda que é uma batalha que já não vale a pena travar.

E, se todos estes talvez se conjugarem, Marques Mendes está sozinho na pista. E cedo, bem cedo.

Faltam dois anos e meio para as eleições presidenciais e o mandato de Marcelo caminha para o fim. Como nos últimos seis meses está impedido de utilizar o poder de dissolução, a relevância política do actual presidente termina daqui a dois anos.

Que país vamos ter daqui a dois anos? Que abertura haverá da sociedade para pensar em quem pode vir a ser o próximo presidente? Como se vai mover o jogo de bastidores entre os cinco possíveis candidatos à direita?

E, já agora, que repercussões pode este tema ter à Esquerda, com as candidaturas já pré-admitidas de Gouveia e Melo e Augusto Santos Silva? E, depois de duas décadas de presidentes de direita, há ainda espaço para um presidente desta área política?

Sem ser grande novidade nem particularmente afirmativa, a disponibilidade de Marques Mendes fez levantar todas estas questões. Está aberto o jogo das cadeiras. Mas, já se disse, no final, só há lugar para um. O que fica com a última cadeira.

Jornalista

DN
Pedro Cruz
29 Agosto 2023 — 00:17


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333: É a política, estúpidos!

 

🇵🇹 OPINIÃO

No ano político que arrancou ontem à noite, com a chamada Festa do Pontal, o PSD tem a última oportunidade para convencer o eleitorado de que pode ser alternativa quando Costa ou Marcelo quiserem.

Vai ser um ano a olhar para as sondagens – ainda que, vão dizer sempre, amaldiçoadas, enganosas, encomendadas, falíveis – a ver se há subidas consistentes e sistemáticas, quem fica em terceiro, quem consegue consolidar posições e deputados.

A Direita, que está em recomposição – com quatro partidos, o CDS tentará sobreviver, nem que seja com a eleição de um deputado para voltar a ter representação parlamentar, embora tenha, antes, de passar pelo teste das europeias e ver se mantém ou não o seu eleito – tem maioria nas intenções de voto, mas, ao contrário do que aconteceu com a Esquerda, será muito difícil negociar uma geringonça com estes quatro partidos.

O PSD, para ser alternativa, precisa de capitalizar os já desiludidos com o Chega, os que descobrirem entretanto que são liberais, mas pouco, os centristas que não migraram nem para um, nem para outro, mas, e sobretudo, precisa de chegar ao Centrão, aos indecisos e ao eleitorado flutuante que decide, em cada eleição, a que partido vai confiar o voto.

Este PSD parece cercado pela sua direita. A atracção pela novidade e frescura da IL e pelo radicalismo do Chega retiram ao PSD margem de progressão. E, por outro lado, condicionam a estratégia de qualquer líder do PSD.

Tem de se chegar ao Centro, como fez Rui Rio, sem sucesso. Mas não pode descolar demasiado da Direita, porque por muito que venha a crescer vai precisar desse apoio se quiser governar.

António Costa, Jerónimo de Sousa e Catarina Martins ensinaram-nos, em 2015, que não governa quem ganha, governa o hemisfério que tiver mais deputados no Parlamento, desde que eles estejam juntos.

O PSD também tem de perguntar aos outros partidos de não-Esquerda se, em caso de vitória eleitoral sua, com minoria, mas com um maioria de deputados de Direita, se os outros estão disponíveis para acordos, e de que tipo.

Há poucas semanas, na TSF, Cecília Meireles, antiga governante e dirigente do CDS, dizia que era necessário uma grande frente de Direita para derrubar o PS e evitar novas maiorias de Esquerda no Parlamento. Foi uma voz única até agora a defender uma federação de votos, não necessariamente uma coligação formal.

Digo que o PSD tem a última oportunidade porque este ano político começa com eleições regionais na Madeira – onde a única questão é saber se o PS e a Esquerda são capazes de ganhar ao PSD e à Direita – e termina em Junho, com as eleições europeias. Infelizmente, em Portugal, as europeias nunca foram vistas como tal, mas sempre como primárias ou intercalares das legislativas seguintes.

As próximas serão isso, uma grande sondagem com voto em urna, um momento para se perceber se o PS, entretanto, se mantém ou se cai a pique e que alternativa é capaz de gerar o PSD. Sozinho, ou como líder de toda a Direita.

Lançados os dados do novo ano político, enquanto nas sedes dos partidos, nos directórios e nas agências de comunicação se prepara a luta política, os portugueses vão continuar a ver os juros a subir, os combustíveis a um preço absurdo, a habitação cara, a inflação a fazer com que o mês seja bem mais longo que o ordenado.

Outros vão continuar a ir às quatro da manhã para a fila do centro de saúde, o ano lectivo vai arrancar com greves e perturbação nas escolas, talvez os sindicatos da CP continuem a fazer greve, que foi o estado normal no último ano e, por fim, a Justiça não vai despertar de repente de um longo e profundo sono em que está mergulhada.

Há de valer, como sempre, o futebol, como escape dos problemas e momento de alienação, que é o tema preferido de conversa dos portugueses. E, a julgar pela supertaça, na última semana, vai haver muitas razões para entreter o povo.

Jornalista

DN
Pedro Cruz
15 Agosto 2023 — 00:19


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322: Este Papa não calça Prada

 

🇵🇹 OPINIÃO

Sou uma pedra no sapato de muita gente” disse o Papa Francisco, numa entrevista a uma revista católica, divulgada a semana passada. E é. Este Papa não calça Prada.

Prefere as sandálias de peregrino e de missionário, habituadas ao pó, ao chão, ao frio e ao calor. Dispensou os luxuosos aposentos papais que lhe estavam reservados no Vaticano e recolheu-se num quarto humilde e simples.

E, na última década, não se cansou de falar dos pobres, dos marginalizados, dos excluídos, dos que sofrem. Já escutámos muitas vezes este discurso de protecção dos mais fracos. Mas, depois, a prática dos políticos em geral contrasta com as palavras.

Foi uma das mensagens que Francisco deixou na visita a Portugal, diante de políticos, diplomatas e forças da chamada sociedade civil. Que falem menos e façam mais, que saibam fazer corresponder as palavras aos actos, que olhem, de facto, para os mais pobres e marginalizados.

Que troquem os sapatos pelas sandálias, os carros de luxo por utilitários, que sejam exemplo, que não exerçam apenas o poder, mas coloquem esse poder ao serviço dos outros.

Na era do virtual, o Papa chama-nos para o real, para o calor de um abraço ou de um beijo, para a importância dos afectos, para um caminho de humanidade em vez de virtualidade.

Francisco, o Papa que veio “do fim do mundo”, é um homem que gosta de futebol e foi guarda-redes; que teve namoradas na adolescência; que esteve nos bairros pobres de Buenos Aires; que saía do Paço para ir ao encontro dos que sofriam. Ao chegar ao Vaticano, levava apenas uma pequena mala, nunca esperou ser chamado para a função papal.

Uma vez em Roma, o Papa teve de lutar, antes de mais, contra o próprio Vaticano; contra a distância que vai dos luxos e prebendas dos cardeais e dos que gravitam na corte papal; contra os que preferem manter os privilégios a sujar os sapatos no terreno; dos que acham que a fé se espalha sozinha, sem atender aos problemas concretos das pessoas reais. Ao dia a dia fora da Cúria.

O Papa, enquanto líder político, que também é, percebeu que este século traz novos e difíceis desafios. Que os jovens precisam de esperança, o mundo precisa de paz e os mais velhos precisam de cuidados.

Construir um mundo novo não vai lá apenas com palavras. São precisas acções concretas, concertadas e acertadas. De todos.

Da Igreja, que ele quer mais perto da realidade, dos políticos eleitos, que precisam de perceber que têm a obrigação de deixar o mundo melhor e, também, de cada um de nós e de que forma podemos contribuir para o todo global.

Na era do virtual, o Papa chama-nos para o real, para o calor de um abraço ou de um beijo, para a importância dos afectos, para um caminho de humanidade em vez de virtualidade.

A pedra que este Papa é, no sapato de muitos, é mais fácil de sacudir se estivermos calçados com sandálias. Mas, no Vaticano e fora dele, entre os poderosos e os decisores, há pouco quem queira pisar o pó. E ele, o Papa, este Papa, tem autoridade, moral e política, mas, sobretudo, humana, para falar destes temas.

Porque não calça Prada.

Jornalista

DN
Pedro Cruz
08 Agosto 2023 — 00:21


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304: O sr. contente e o sr. feliz

 

🇵🇹 OPINIÃO

Vai longe, muito longe a imagem idílica daquele 10 de Junho de 2016 em Paris. Diante de milhares de portugueses e luso-descendentes reunidos numa festa popular, Marcelo discursava e a chuva de verão começou a cair cada vez mais grossa.

Costa, na retaguarda do presidente, protegeu o chefe de Estado com um guarda-chuva, onde se podia ler, mesmo à distância, a palavra “fidelidade”.

Era o princípio de uma nova era. Cavaco Silva tinha deixado Belém e Marcelo trazia uma nova aragem ao palácio.

Naquela tarde em Paris, o professor e o antigo aluno pareciam dois enamorados, enfeitiçados por um país que acabara de sair da troika e que ansiava virar a página. Um e outro estavam sintonizados como raramente um primeiro-ministro e um Presidente da República tinham estado.

Se Costa era sr. contente, o “optimista irritante”, como, carinhosamente, lhe chamou Marcelo, o presidente era o sr. feliz, com um país a seus pés, repenicado de abraços, beijos, afectos e selfies. Nos anais da política portuguesa, este período de início de mandato de ambos será recordado como o da cumplicidade perfeita.

Mesmo que, logo desde esses tempos, Marcelo fizesse questão de clarificar que havia uma perfeita harmonia entre “um presidente de direita e um governo de esquerda”.

Oito anos depois, Costa continua contente, mas Marcelo já não está tão feliz. Na segunda eleição, não conseguiu bater o recorde de votos da segunda vez de Mário Soares.

Viu, já este ano, a sua popularidade descer a níveis que nunca julgou possíveis; os beijos, abraços e selfies já não são novidade e está a caminho do fim do mandato.

Faltam dois anos e meio sendo que, nos últimos seis meses, o presidente perde a capacidade de dissolução do parlamento, a chamada “bomba atómica”, o único e verdadeiro poder presidencial, na opinião de politólogos e analistas.

E se Costa ficar até ao fim da legislatura, Marcelo terá atravessado toda a sua magistratura com o mesmo primeiro-ministro, que chegou a São Bento antes de Marcelo ser eleito e que deixará São Bento já com outro presidente em Belém.

Este domingo, Marcelo explicou porque vetou e porque promulgou, depois de corrigido, o decreto-lei sobre as carreiras dos professores. E deixou claro que negociou com o sr. contente as alterações que achava necessárias para poder aprovar o documento.

No fundo no fundo, bastou um advérbio de modo para, designadamente, o presidente considerar que havia “um mínimo” de condições para que o decreto pudesse ser aprovado. Um “designadamente” que, aparentemente, fez Marcelo mudar de posição.

Desta forma, o decreto não fica “fechado”, e deixa a porta “entreaberta” para que as negociações possam continuar, com a perspectiva futura da recuperação total do tempo de serviço que os professores reclamam.

Mas – e tem havido sempre um mas nas declarações, faladas ou escritas, do Presidente da República – este domingo Marcelo deixou uma frase que passou despercebida nas notícias e nos comentários.

A certa altura, quando justificava a “interferência” em matéria que é da competência do governo e, por isso, antecipando críticas, o presidente considerou que só ele pode “controlar” a maioria absoluta.

“Só há um controlo da maioria absoluta, que é o Presidente da República”, afirmou o sr. feliz, lembrando que o sistema é semi-presidencial e não parlamentarista e que, nestes casos de maiorias absolutas, não se pode contar com o parlamento, porque a maioria dos deputados suporta o governo e deixa pouca margem para a oposição.

O verdadeiro fiscal do governo, o único que pode travar os desmandos absolutos de uma maioria está em Belém.

E, com a dupla a caminho do fim dos mandatos, Marcelo quis deixar bem claro que vai interferir, vigiar, controlar, influenciar, intervir e vetar, quando for caso disso. Ainda assim, Costa continua contente e Marcelo já não parece tão feliz.

Embora a dupla esteja condenada a entender-se até ao último dia, mesmo que a palavra “fidelidade” já não caiba no cenário.

Jornalista

DN
Pedro Cruz
01 Agosto 2023 — 00:23


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281: Primeiro, estranha-se. Depois, entranha-se

 

🇵🇹 OPINIÃO

Na longínqua noite eleitoral de 2015, Jerónimo de Sousa, então secretário-geral do PCP, no seu discurso às vezes cifrado, redondo e repetitivo, deixou uma frase que só dias mais tarde, depois de recuperada, se entendeu em toda a sua plenitude.

Passos Coelho acabava de ganhar as eleições, depois de quatro anos debaixo de um programa de resgate, e o PCP lembrou que, apesar disso, o “PS só não governa se não quiser”. Na Soeiro Pereira Gomes as contas estavam feitas e, pela primeira vez em democracia, o partido mais votado corria o risco de não governar.

O PCP, institucionalista, lembrou ao país que não elegemos um primeiro-ministro, mas que, no nosso sistema parlamentarista, elegemos deputados que depois viabilizam um Governo. Nada mais claro.

A história do que se seguiu já se sabe. A formação de uma solução de Governo que ficou conhecida como “geringonça” inverteu a ordem “natural” das coisas e colocou o partido derrotado no Governo e o vencedor das eleições na Oposição. Até hoje.

Nessa altura, em Espanha – que atravessava uma situação parecida, com um bloqueio parlamentar para a investidura de um novo Governo, o PSOE, que parecia irremediavelmente condenado a uma erosão bastante rápida, tal como já tinha acontecido com partidos socialistas de outros países europeus, como a Itália, a Grécia e, sobretudo, França – a solução encontrada do outro lado da fronteira era um ovo de Colombo e permitia desfazer o bloqueio saído das urnas.

(…) Deve um partido que perdeu as eleições, governar, ainda que para isso tenha de aceitar a chantagem, imposição e condições de pequenos partidos?

Aberto o precedente, a que muitos chamaram “golpe de estado constitucional”, mas que não passa de uma leitura cristalina e clara, levada à letra, do parlamentarismo, os eleitores perceberam que a “tradição” não-escrita do “quem ganha governa” era já letra morta.

Na política não há tradição que valha quando está em causa uma possibilidade de chegar ao poder.

Primeiro estranha-se, depois entranha-se e a geringonça governou durante quatro anos com estabilidade e paz social, com a ajuda involuntária de Cavaco Silva, o então presidente, que obrigou os vencidos a fazerem acordos escritos para que, dessa forma, desse posse ao Governo socialista com o suporte do Bloco de Esquerda e do PCP.

Em Espanha, depois das eleições de domingo, o cenário é exactamente o mesmo. O partido mais votado e os seus aliados naturais não conseguem maioria absoluta.

E, nos discursos da noite eleitoral, Feijóo parecia o derrotado, pedindo ao PSOE para não “boicotar” a formação de um Governo do PP, e Sánchez, derrotado por “poucochinho”, dava ares de vencedor, garantindo que os conservadores tinham sido derrotados.

Na simples aritmética dos votos, a Esquerda (toda junta) tem mais mandatos que a Direita somada. Sánchez sabe disso e terá de fazer pactos com o Diabo – ou seja, com nacionalistas e independentistas – para poder governar. Como não lhes pode dar a possibilidade de referendos, nem lhes quer dar mais autonomia, que tem Sánchez para oferecer? Muito pouco.

Mas a questão continua a colocar-se – deve um partido que perdeu as eleições, governar, ainda que para isso tenha de aceitar a chantagem, imposição e condições de pequenos partidos?

Não há, nestas soluções, nenhuma distorção da democracia. Pelo contrário. Trata-se do escrupuloso cumprimento da proporcionalidade dos votos depositados nas urnas.

Já não estamos a votar em partidos. Estamos a votar em blocos ideológicos. E, isso sim, acaba por ser um enviesamento da democracia. E um esvaziamento dos partidos. Que são o suporte da democracia. Depois é tarde para se estranhar. Fica entranhado.

Jornalista

DN
Pedro Cruz
25 Julho 2023 — 00:29


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261: O Presidente (não) está no palácio

 

– É importante realçar e bem simples de enunciar: os portugueses e contribuintes conscientes, estão fartos destes políticos e dos partidos a que pertencem, daí a elevada abstenção que é sinónimo desta desilusão a quem promete e nada cumpre, sejam eles de esquerda ou de direita porque é tudo farinha podre da mesma saca, embora com cores diferentes. Quanto ao sr. Marcelo, nada de novo no horizonte desde os tempos em que era comentador das TV’s.

🇵🇹 OPINIÃO

Estranho país este, onde a maioria dos eleitores não quer eleições antecipadas, segundo dizem as sondagens. Mas também considera, a maioria, que o governo não está a governar bem.

É, ao mesmo tempo, uma vontade e o seu contrário. O PS tem vindo a perder apoio popular, já desceu mais de dez pontos no último ano e, nesta altura, há um empate técnico entre socialistas e sociais democratas.

Como analisar, então, o Estado da Nação, se os cidadãos estão numa contradição insanável? Ou, pior ainda, e talvez seja esta a leitura mais correta, nem pensar em eleições agora porque não há, ainda, uma alternativa que seja credível?

Encurralados entre um governo que tropeça nas suas próprias trapalhadas e fragilidades, assolado por demissões quase à razão de uma por mês e uma oposição à esquerda que ainda se está a recompor das mudanças de liderança, e à direita, com os novos partidos a crescer e o PSD a manter-se com valores historicamente baixos, que não lhe permitem sonhar, para já, voltar ao poder, o mesmo eleitorado diz, nas sondagens, que a direita, toda junta, tem já mais votos que a esquerda.

A geringonça perde terreno para o outro lado do hemisfério ideológico e o Chega, como se previa, arrisca-se a ser o partido de charneira, capaz de viabilizar uma maioria à direita ou, noutra leitura, impedir uma maioria de esquerda. Tal como, nesta altura, o PS está cercado, nos partidos que crescem, Ventura tem razões para sorrir.

Diante deste estado de coisas, que esperar do debate do Estado da Nação desta semana? Certamente como sempre, Costa e o governo vão olhar para o copo meio cheio e puxar dos galões dos apoios sociais, do pacote de habitação, dos novos médicos e professores entretanto contratados, dos aumentos anunciados nas pensões, nos números da inflação que está a baixar, do menor peso da dívida e dos resultados do défice. E ainda falta que o PRR chegue às empresas, à economia e às famílias.

Costa vai continuar a querer ganhar tempo. Tempo é o que o primeiro-ministro precisa para que, depois de o “país estar melhor”, os bolsos dos portugueses também estejam. Ironia da política e dos ciclos económicos, a frase que o PS criticou a Montenegro quando este era líder parlamentar nos tempos da Troika, é agora o mantra que segue a maioria absoluta à espera de tirar partido do PRR e da conjuntura.

Do outro lado, toda a oposição vai querer ver um copo meio vazio ou cheio de quase nada. Vai insistir nas demissões dentro do governo, no caso TAP, no problema Galamba, na falta de médicos, nas urgências e hospitais fechados durante o verão, na greve dos professores, da CP, dos oficiais de justiça.

Vai dizer que saúde, tribunais e escolas estão fora de controlo e que Costa nada fez durante mais de um ano com a preciosa maioria absoluta que pediu e que teve.

De Belém, os mesmos portugueses sondados também esperam uma actuação mais atenta e vigilante do Presidente da República, com maior parcimónia no uso da palavra e mais firmeza diante do governo. Não parece difícil que Marcelo Rebelo de Sousa faça a vontade ao seu afectuoso povo.

Não só porque o presidente também vê as sondagens como, depois do caso Galamba, e na contagem decrescente para o final do mandato, Marcelo já não tem nada a perder. Faço um desafio aos leitores: vejam ou revejam um qualquer debate do Estado da Nação de anos – ou décadas – anteriores. Este vai ser exactamente igual.

O governo a proclamar vitórias, a oposição a elencar falhanços. Por isto, mas não só, é tão importante o que virá de Belém durante o próximo ano.

Porque daqui a um ano há eleições europeias. E o tudo pode mudar. Incluindo o estado da nação. Marcelo, esteja dentro ou for a do palácio vai, seguramente, estar no centro da vida política. Como ele gosta.

Jornalista

DN
Pedro Cruz
18 Julho 2023 — 00:17



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247: (N)os sapatos do outro

 

“… Convém, antes de mais, lembrar que “os comentadores” não criam factos.“.

Convém também aqui lembrar e/ou recordar, que a maioria dos “comentadores” do jornalixo actualmente existente em Portugal, estão ao serviço dos partidos de que são simpatizantes ou militantes. Daí que, em sequência dos factos, criam teses que os favorecem e à sua pseudo-imagem independente, ao arrepio das realidades! E não, não estou, de modo algum, em defesa desta governança que me rouba o pouco que recebo! Estou apenas a considerar o moralismo da treta de muitos “comentadeiros” do jornalixo e telelixo, os quais não têm cabimento neste Blogue.

🇵🇹 OPINIÃO

Os comentadores são uma nova espécie que actua no espaço público, segundo António Costa. Nos últimos anos, amiúde, o primeiro ministro referiu-se, quase sempre sem grande entusiasmo e empatia, aos “comentadores”.

Segundo Costa, consta que os comentadores, por regra, não estão alinhados com o governo. E esses mesmos comentadores, pasme-se, comentam, analisam e dão opinião sobre os factos, dos mais diversos, que alimentam o dia a dia da rés-pública.

Convém, antes de mais, lembrar que “os comentadores” não criam factos. O grande criador de factos dos últimos 50 anos está ocupado e, quando comenta, não deveria fazê-lo.

O outro aprendiz de criador de factos comenta, na verdade, mas só matérias de interesse internacional, pelo que, nesta fase, também não (re)cria factos. Sobram, portanto, os “comentadores” que olham para os factos e fazem uma leitura.

Costa pode queixar-se muito dos comentadores, mas não pode responsabilizá-los pelo que acontece. Apenas pela interpretação, contextualização e análise.

Este fim de semana, de t-shirt e camisa por fora das calças, o primeiro-ministro informal voltou a referir-se aos comentadores. Não percebe, António Costa, que a demissão de um secretário de Estado, constituído arguido na mesma manhã em que pediu a exoneração, por estar indiciado num processo de corrupção, mereça comentário.

E mais. O chefe do governo assegura que não são estes temas — os que os comentadores comentam — que interessam aos portugueses. Como anda “muito na rua” Costa sabe exactamente as matérias que interessam aos cidadãos.

E, entre essas, não está, certamente, mais um — o décimo terceiro — governante que sai de um governo que só tem 15 meses. Costa não vê interesse nenhum no tema.

Tem, até, uma certa razão. Há uma diferença entre a realidade a percepção. Os portugueses com quem Costa se cruza na rua estão, como disse o primeiro ministro, preocupados com a inflação, a taxa de juro do crédito à habitação, o preço da gasolina e do cabaz alimentar.

No dia a dia dos cidadãos, dos processos judiciais a secretários de estado demissionários não são a prioridade para quem tem de pagar a casa e pôr comida na mesa. Mas, depois da realidade, vem a percepção.

Que, como sabemos, transforma muitas vezes a realidade numa outra realidade. E, aí, na percepção, António Costa já não tem razão.

Olhar para o governo e ver que se trata de um queijo suíço, cheio de buracos, à média de quase uma demissão por mês; perceber que as “trapalhadas”, vamos chamar-se assim, que levaram a sucessivas demissões no governo por questões judiciais se tornaram, no último ano, um padrão e não uma excepção; perceber que a maioria absoluta, ao contrário do que pediu e prometeu ao eleitorado, não criou estabilidade mas incerteza e que essa instabilidade e incerteza vem de dentro do próprio governo; todos estes factos — e não opiniões — são como fogo na pradaria para dar gás ao populismo, ao discurso do “eles são todos iguais” ou do “é preciso uma limpeza”.

No último ano, o PS perdeu dez pontos nas sondagens. Se as eleições fossem hoje, segundo o último estudo, o PS e PSD estariam num empate técnico. Vale a pena olhar com atenção para estes dados e perceber quem, no último ano, subiu nas intenções de voto. E porquê.

Desvalorizar situações graves, como fez o primeiro ministro em versão informal este fim de semana, não é apenas varrer o lixo para debaixo do tapete, é também ficar à espera que ninguém levante o tapete.

E mesmo que ninguém levantasse o tapete — claro que lá estão os comentadores, essa espécie irritante que ainda por cima não percebe quais são as prioridades — o lixo continuaria lá, apenas não se veria.

António Costa já foi comentador. Talvez valesse a pena ao primeiro ministro voltar a calçar esses sapatos, nem que fosse por um dia. Porque quando tentamos calçar os sapatos dos outros, talvez tenhamos uma grande surpresa.

Jornalista

DN
Pedro Cruz
11 Julho 2023 — 00:45



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210: O vento que sopra da Costa

 

🇵🇹 OPINIÃO

Este fim de semana, o vento que assolou a Madeira entrou de rompante na sala onde decorria a abertura das jornadas parlamentares do PS. E levou tudo à frente. Liberto do peso do casaco e da gravata, Costa, o Secretário-Geral, o líder de um partido com maioria absoluta, já perdeu um ano dessa “estabilidade” enredado, como diz o próprio, “em casos e casinhos”, grande parte deles vindos do interior do governo e do partido.

Esse mea culpa Costa não o fez e não o fará. Não coube no discurso do Funchal. Mas o vendaval que atravessou a sala da reunião dos deputados do PS não atingiu apenas a oposição. Também — ou sobretudo — chegou bem fundo ao próprio PS.

Bem sabemos que, tal como dantes, no futebol, se dizia “o que hoje é verdade, amanhã é mentira”, a política há muito que imita o pior do futebol. E, portanto, o que hoje está escrito na pedra como verdade absoluta e irrevogável, pode deixar de o ser.

A própria palavra “irrevogável” perdeu a sua definitiva definição, quando se tornou o contrário disso. Chegam depois as explicações para o volte face: a conjuntura, o interesse nacional, as circunstâncias, as inevitabilidades.

Mas, a acreditar — a oposição já disse que não acredita — nas palavras de Costa, o furacão de palavras do fim de semana deixou duas certezas: não procura nenhum cargo europeu e, por outro lado, será candidato às próximas legislativas. Até lá, é governar para baixar o défice e a dívida. E os impostos, até 2026.

Costa deixou, mais uma vez, o partido sem palavras. Os potenciais, putativos, eventuais pré-candidatos à sucessão vão ter de esperar. O Secretário-Geral não vai sair, mesmo que a legislatura vá até ao fim, desejo reconfirmado pelo próprio este fim de semana.

E quando a legislatura acabar, Costa está de novo candidato e disponível para voltar a ser julgado pelo povo e pedir meças pelo que fez (e não fez).

Neste quadro, as próximas duas eleições internas são de Costa. O PS e os partidos de poder não afastam da liderança quem ganha, quem governa ou quem está em condições de derrotar o PSD. Costa, está.

Embalado pelas sondagens, que lhe voltam a dar a vitória, Costa falou grosso ao partido. Está para ficar, deixem-se de coisas. E, ao mesmo tempo, desfez o tabu que a oposição alimentava para justificar eleições antecipadas.

Não, não vai para nenhum cargo europeu. Fica mesmo aqui. Os que diziam que Costa está farto dos portugueses terão de engolir em seco.

Posto tudo em pratos limpos, talvez, em oito anos, Costa nunca tenha sido tão claro e enfático. Fica no partido, fica no governo, fica no país. Habituem-se.

Claro que os ventos podem mudar. As eleições europeias, daqui a um ano, são o teste pelo qual todos esperam, Presidente da República incluído. E, talvez depois disso, dessas eleições, desse teste, dessa prova que Costa vai ter de passar, alguma coisa possa mudar.

Para já, o secretário-geral esvaziou totalmente a luta interna de poder, mandou os candidatos à sucessão para a sala de espera e desafiou a oposição e fazer melhor. Colocou o ónus no PSD. E ficou “livre” para governar. Costa precisa de tempo.

Precisa que a economia chegue ao bolso dos eleitores, precisa que o PRR chegue ao país real, precisa que os anúncios de melhores dias se transformem, de facto, em melhores dias. Quando voltar ao continente, Costa terá nova vida, mais um ano de caução e de governo. Até às Europeias.

Jornalista

D.N.
Pedro Cruz
27 Junho 2023 — 00:15



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