🇵🇹 OPINIÃO
J’avais vingt ans. Je ne laisserai personne dire
que c”est le plus bel âge de la vie. Tout
menace de ruine un jeune homme: l’amour,
les idées, la perte de sa famille, l’entrée
parmi les grandes personnes.
Paul Nizan, Aden-Arabie
– Embora com o meu francês mais que enferrujado dado que não o falo há décadas, vou ajudar na tradução: “Eu tinha vinte anos. Eu não vou deixar ninguém dizer que é a idade mais bonita da vida. Tudo ameaça arruinar um jovem: amor, ideias, perda de família, entrada entre os adultos.“
Não sei se aos meus leitores mais jovens (se os tiver…) dirá alguma coisa o nome de Paul Nizan, um autor que muito citávamos na nossa geração, sobretudo este texto em epígrafe (para quem souber ler francês…), que dava conta da imensa confusão que significava para nós a saída da adolescência.
É verdade que nós saíamos da adolescência num mundo tão diferente do actual, que nos poderemos até sentir mais perto deste jovem intelectual francês dos Anos 40, dividido entre o seu ideal comunista e a realidade brutal e inaceitável do pacto de 1939 entre Hitler e Estaline. Mas temos de aprender a distanciar-nos dos nossos modelos de referência para compreendermos o novo e os novos.
É demasiado fácil (e muitos o fazem) partir do princípio de que os mais novos estão condenados, pela tirania redutora do digital, a desenvolverem mentes uni-dimensionais e acríticas, e pela sua formatação num mercado competitivo e pretensamente meritocrático, em individualistas egocêntricos, alheios à ideia de solidariedade e a quaisquer perspectivas de transformação social.
Os quadros de referência e a informação cultural podem ter mudado, mas as preocupações com o mundo e o desejo de o mudar permanecem vivos e activos nas novas gerações.
Este discurso lamechas e queixoso vem, quase sempre, de quem não está minimamente aberto a dialogar e a entender. A desilusão dos jovens com os rituais políticos, que à nossa geração custou muito a reconquistar, e que têm por nome comum “democracia”, corresponde à insatisfação com um sistema político que em todo o mundo democrático não tem conseguido ir ao encontro das necessidades sociais reais das pessoas, esmerando-se antes em jogos florentinos, a que só uma pequena bolha político-mediática acha graça. Abrir o terreno para propostas autoritárias parece até ser o secreto objectivo dessas políticas crescentemente impopulares.
Temos assistido à elevada consciência com que as novas gerações levam a sério a ameaça climática, com que todos nós fingimos preocupar-nos, mas que depressa passam na agenda pública da maior à menor prioridade.
Conversando com os novos, como tive oportunidade de fazer neste fim de semana, num encontro promovido pela organização do Erasmus Portugal, encontrei jovens bem informados (e se o foram pela Internet, que importa?) sobre os mais candentes conflitos contemporâneos e os mais sérios problemas internacionais.
Tive a mesma impressão ao dialogar com estudantes de Ciência Política do ISCSP e da Universidade Nova. Os quadros de referência e a informação cultural podem ter mudado, mas as preocupações com o mundo e o desejo de o mudar permanecem vivos e activos nas novas gerações.
O discurso estafado da indiferença política e social da juventude corresponde a uma falta de capacidade nossa para entrosar os ideais e projectos políticos que defendemos, cujos princípios fundamentais não mudaram com o tempo, com as preocupações e necessidades reais da juventude, no quadro de um mundo que mudou vertiginosamente, mas no qual as realidades da intolerância, da exclusão e da extorsão são as mesmas, com vestes novas e brilhantes.
Devemos ter a humildade intelectual de reconhecer que os problemas mudaram, que os quadros mentais são outros e que muito temos nós também de ouvir e aprender.
São as novas gerações que irão conduzir as mudanças do mundo, num contexto terrível e perigoso, de máxima imprevisibilidade e de crescente capacidade de fabricação de ilusões. A tarefa deles não é fácil. Eu também não diria hoje que 20 anos é a mais bela idade da vida…
Diplomata e escritor
DN
Luís Castro Mendes
19 Setembro 2023 — 00:26
Ex-Combatente da Guerra do Ultramar, Web-designer,
Investigator, Astronomer and Digital Content Creator
published in: 3 dias ago