– “… Nota: Se este texto for considerado mal-educado a culpa não é do seu autor que, coitadinho, ainda só tem 50 anos de vida. Responsabilizem o avô dele.”
Pessoalmente, não me sinto ofendido pelo que o cronista escreveu. Em democracia, a Liberdade de Expressão é um factor crucial mas também existe o direito ao contraditório. E o meu, que nem aprecio futebol, o qual não passa de um mercado de escravos, apenas sinto amargura em constatar que o meu Português, o de Camões, esteja a ser vilipendiado por um pseudo Acordo Ortográfico, que injecta o brasuquês no seu dia a dia e, pior ainda, por intelectualóides que deviam ter vergonha em o utilizar.
🇧🇷 OPINIÃO
Vítor Pereira, para quem não está familiarizado com o futebol, é um treinador português com passagens pelo FC Porto e por meio mundo, incluindo o Brasil. Ao sair do país sul-americano conseguiu a proeza de desiludir os cerca de 70 milhões de adeptos dos dois clubes locais mais amados, Flamengo e Corinthians.
Já em Portugal, disse que no Brasil não dão tempo para os treinadores trabalharem e que há uma falta de educação generalizada no país. Não são mentiras, todos concordam, incluindo os brasileiros – o problema é que ele é o último a poder falar no assunto.
Primeiro, porque não é educado – lá está – cuspir no prato onde comeu uns bons milhões de reais. E, depois, porque o Corinthians até lhe deu tempo para trabalhar – convidou-o a renovar contrato. Contrato esse que ele não renovou, alegando ter de voltar a Portugal por problemas familiares – semanas depois estava a assinar pelo Flamengo. E no gigante carioca perdeu quatro competições em quatro meses – ora, com essa performance, em qualquer lugar do mundo, não só no Brasil, o treinador arrisca-se a perder o emprego.
Posto isto, as declarações de Pereira foram, logicamente, respondidas à letra no pântano das redes sociais, mas também nos meios de comunicação social sérios do Brasil, como a SporTV, do grupo Globo. Lá, até o jornalista André Rizek, normalmente pouco dado a patriotadas, preferiu usar o fígado para responder a Vítor Pereira: “Se somos mal-educados devemo-lo aos nossos colonizadores.”
O programa em causa, Seleção SporTV, foi para o ar dia 11, dia em que o Brasil somava 201 anos, mais quatro dias, de vida independente. No entanto, o bebezão de 201 anos ainda prefere transferir as responsabilidades dos seus defeitos para o avô.
É um expediente muito útil a que, na verdade, os portugueses bem podiam recorrer. Falta-nos educação? Culpa dos romanos; os hospitais não funcionam? Responsabilidade dos mouros; não há emprego? Problema dos celtas. E ainda sobram suevos, visigodos, fenícios, cartagineses e demais colonizadores para expiarem as outras, muitas, mazelas nacionais.
Outro expediente útil usado no Brasil é, além de imputar tudo o que de mau lhe acontece aos colonizadores, atribuir as muitas qualidades dos brasileiros, como a alegria, a hospitalidade ou a criatividade insuperáveis, a… eles próprios. Em resumo: os defeitos são culpa de Portugal; as qualidades são obra e graça do divino Espírito Santo.
Se o Brasil é hoje uma potência ambiental – e geográfica, demográfica e até económica – deve-o à área e à unidade que tem. Caro paulista, tivesse a coroa portuguesa esquartejado a sua metade da América, como a espanhola esquartejou, e hoje a riquíssima Amazónia não pertenceria ao seu país. Caro amazonense, tivesse a coroa portuguesa esquartejado a sua metade da América, como a espanhola esquartejou, e hoje o abastado estado de São Paulo não pertenceria ao seu país.
Ninguém põe em causa, claro, que a colonização portuguesa (assim como todas as demais) ofereceu um vasto cardápio de crueldades. E ninguém deixa de aplaudir que se conte, cada vez mais, a História do Brasil da perspetiva de quem já lá estava na América e de quem para lá foi, escravizado, de África.
Mas o Brasil comportar-se como um bebezão, aos 201 anos, é demais.
Nota: Se este texto for considerado mal-educado a culpa não é do seu autor que, coitadinho, ainda só tem 50 anos de vida. Responsabilizem o avô dele.
Jornalista, correspondente em São Paulo
DN
João Almeida Moreira
21 Setembro 2023 — 01:54
– Ao contrário de TODOS os textos inseridos neste Blogue, que são corrigidos de brasuquês para português original, o texto deste cronista não é ortograficamente corrigido dado que respeito a sua origem e a sua ortografia nativa.
Ex-Combatente da Guerra do Ultramar, Web-designer,
Investigator, Astronomer and Digital Content Creator
published in: 1 dia ago