407: A Era das Vacinas (III)

 

🇵🇹 OPINIÃO

Em semanas anteriores foram descritas nestas páginas as 3 etapas iniciais sobre a preparação de vacinas, desde a antivariólica, à atenuação ou inactivação dos micróbios patogénicos (ex. antidiftérica), até ao método de fabrico por técnicas de engenharia genética, como acontece com a vacina contra a infecção pela hepatite B que deve ser administrada à criança recém-nascida, logo a seguir ao nascimento, antes de sair da maternidade.

Foi, note-se, a primeira vacina utilizada contra uma doença oncológica, visto que previne o cancro do fígado.

Ver-se-á, hoje, que os avanços tecnológicos e científicos foram imensos, tendo permitido lançar novas vacinas, incluindo para a Pandemia de Covid-19.

4 – Resume-se, a seguir, a espantosa descoberta obtida com surpreendente sucesso por Ugur Sahin e sua mulher Ozlem Tureci. Estes dois cientistas que trabalham na Alemanha são um casal de médicos de origem turca. Conseguiram produzir vacinas inteligentes que induzem a produção de anticorpos protectores, mas indirectamente.

Isto é, em lugar da vacina ser feita a partir do agente viral causador da Covid-19, prepararam a injecção de um mensageiro (ARN) que depois de ser inoculado no organismo humano “dá ordens” para ser fabricada uma proteína igual à presente na espícula do vírus.

Ora, o sistema imunológico ao identificar esta nova substância como estranha reage com a produção de anticorpos dirigidos especificamente para essa proteína presente no organismo, mas que é idêntica à viral.

Depois, se o verdadeiro vírus for transmitido a uma pessoa, encontrará os anticorpos anteriormente produzidos pelo sistema imunitário que, assim, funcionam como protectores.

Essa mesma vacina contra o Covid-19, adaptada às novas variantes do vírus original que foram surgindo, continua a estar indicada, em 2023-2024, porque o vírus se mantém em circulação.

5 – Por outro lado, é preciso recordar que “não há Inverno sem gripe”. Os diferentes tipos do vírus da gripe circulam nas semanas frias do ano, mas alternadamente nos dois hemisférios: quando faz frio no Brasil ou em Moçambique, faz calor em Portugal e vice-versa, quando é inverno em Portugal é a estação quente no Brasil ou Moçambique.

Acontece que durante esta volta ao mundo os vírus vão sofrendo alterações (mutações), motivo pelo qual a vacina que foi aplicada na estação de inverno de 2022, já não é eficaz no ano seguinte.

Por isso, tem que ser fabricada de novo com as previsões das mutações baseadas nas análises laboratoriais dos tipos de vírus quando circulam no outro hemisfério.

É oportuna a decisão tomada pelo Ministério da Saúde, no seguimento da proposta da DGS, em juntar a administração das duas vacinas para a gripe e Covid-19.

Ainda bem que assim sucede. Deliberação acertada porque a vacinação simultânea é segura e muito compensadora em termos de custos. Aliás, todos os especialistas admitem que os resultados da vacinação são altamente custo-efectivo.

Por outras palavras, em termos de custo-efectividade, os dinheiros públicos são bem utilizados porque a redução da probabilidade de ocorrerem internamentos hospitalares por doenças graves, evitadas pela vacinação, é lucrativa.

Moral: As vacinações contra a gripe sazonal e Covid-19 são gratuitas. Quem for vacinado compra, por zero euros, menos doenças para o inverno. O Estado paga e ganha!

(continua na quarta-feira)

Ex-diretor-geral da Saúde
franciscogeorge@icloud.com

DN
Francisco George
20 Setembro 2023 — 00:29


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390: A Era das Vacinas (II)

 

🇵🇹 OPINIÃO

O artigo anterior foi dedicado à primeira fase das vacinas que começou na viragem do século XVIII para XIX em plena Revolução Industrial, mas antes dos primórdios da Microbiologia que germinou no seguimento das pesquisas impulsionadas pelo químico francês Louis Pasteur e pelo cientista alemão Robert Koch.

As investigações de um e de outro foram estimulantes. Pela primeira vez, as bases científicas dos seus trabalhos inauguraram um novo ciclo na História da Medicina.

Desde então, os avanços científicos e tecnológicos foram decisivos para a preparação e afinação de novas vacinas destinadas a prevenir, em segurança, muitas doenças infecciosas quer de origem bacteriana, quer viral. Um imenso progresso.

2 Vacinas preparadas por inactivação ou atenuação dos micróbios patogénicos.

Nesta fase, a essência das investigações sobre novas vacinas tinha, sempre, por objectivo descobrir a forma de enganar o sistema imunitário do corpo humano, levando-o a criar anticorpos contra os próprios micróbios presentes na vacina, mas sem provocarem doença.

Para tal, era necessário transformar os micróbios de maneira a serem inofensivos, mas com a capacidade de induzirem respostas imunitárias como se verdadeiros fossem.

Assim aconteceu com sucesso. Os principais agentes microbianos patogénicos causadores de doença humana foram atenuados ou inactivados através de métodos laboratoriais inovadores.

Deste modo, essas vacinas, depois de administradas, conseguem despertar a formação de anticorpos protectores pelo sistema imunitário, como se os agentes inoculados fossem patogénicos.

Os trabalhos experimentais conduzidos por Louis Pasteur e por Robert Koch, depois seguidos por muitos outros, foram determinantes para a obtenção e colocação no mercado de vacinas contra a raiva, tuberculose, difteria, tétano, tosse convulsa, poliomielite e gripe.

A descoberta da vacina anti-rábica por Pasteur (1885) assinala o início desta época, marcada pela interligação virtuosa entre a Microbiologia e a Medicina. A eficácia da vacina contra a raiva humana (viva atenuada) antecedeu a criação do famoso Instituto Pasteur de Paris.

Em Portugal, logo em 1892, foi criado o Real Instituto Bacteriológico (mais tarde chamado de Câmara Pestana) para proteger as pessoas mordidas por animais raivosos.

Todas as vacinas, passaram a ser fabricadas a partir do agente microbiano que causa a respectiva doença, quer pela inactivação (vacinas mortas), quer por atenuação (vacinas vivas atenuadas), a partir de culturas dos próprios agentes das doenças, tanto de natureza viral como bacteriana.

Se bem que tenham níveis de eficácia diferentes, foram introduzidas em programas de vacinação com resultados positivos indiscutíveis.

Realce-se que as vacinas contra a difteria, o tétano e a tosse convulsa são fabricadas, desde 1926, a partir das respectivas bactérias inactivadas (mortas).

3 Vacinas fabricadas por recombinação do ADN.

Incluem-se neste grupo as vacinas contra a hepatite B e contra a infecção pelo vírus do papiloma humano. Ambas, são fabricadas por métodos de engenharia genética que modificam os vírus originais, que deixam de ser patogénicos, mantendo a competência de formarem anticorpos.

Como estas infecções virais podem evoluir para cancro, as vacinas são anti-cancerosas! A primeira contra o cancro do fígado e a segunda contra o cancro do útero.

(continua)

Ex-director-geral da Saúde
franciscogeorge@icloud.com

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Francisco George
13 Setembro 2023 — 00:55


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284: A Era dos Antibióticos (V)

 

– Em ordem ao PS (post scriptum) do cronista neste artigo de opinião, infelizmente existem muitas pessoas que não podem ter férias relaxadas e tonificantes alternadamente nas Azenhas do Mar ou em Vila Real de Santo António, nomeadamente os desempregados, os idosos de rendimentos miseráveis e afins. Porque mal chega para a farmácia ou para as despesas correntes de sobrevivência. Contudo e depois dessa eloquente transmissão de afazeres nas férias com a família, os amigos, em jantares já aprazados e com mesas reservadas nos restaurantes habituais, discussão e trocas de pontos de vista e afins, votos de um bom descanso físico e espiritual.

🇵🇹 OPINIÃO

Em quatro capítulos anteriores tentou esclarecer-se o preocupante problema que a crescente ineficácia de alguns antibióticos e outros anti-microbianos representa actualmente.

Essa ineficácia é devida ao aparecimento de resistências das bactérias, vírus, protozoários e dos fungos aos respectivos medicamentos que, assim, deixam de ter efeito terapêutico. A dimensão que assume à escala global constitui um dos principais desafios em Saúde Pública. Uma pandemia.

Esta situação, se não for rapidamente controlada, poderá fazer regressar a ERA ACTUAL até aos anos antes de 1941, altura do lançamento no mercado mundial da penicilina como primeiro antibiótico.

Isto é, voltar-se-ia à época anterior aos antibióticos, onde as infecções não tinham tratamento eficaz (seria de novo o tempo antigo da Medicina sem anti-microbianos).

O assunto, compreende-se, é muito sério e exige a mobilização de todos. Mas, mesmo todos, sem qualquer excepção, a começar pelos titulares dos órgãos de soberania que têm de assumir as respectivas responsabilidades na adopção de medidas de controlo. Deles, espera-se acção. Determinação. Firmeza. Vigor.

Por exemplo, durante as audiências de quinta-feira do PM em Belém, o Presidente poderia pedir o ponto da situação sobre o assunto, até porque todos os chefes de Estado estarão envolvidos no tema agendado para a Assembleia-Geral das Nações Unidas de 2024.

Os deputados ocupam-se da legislação sobre o tema e de fiscalizar a condução dos programas governamentais.

O ministro da Educação, nas escolas de todos os níveis de ensino, introduz programas pedagógicos adequados, naturalmente, à idade das crianças, dos adolescentes e dos jovens.

O Ministério Público também deve estar atento ao, eventual, não-cumprimento das leis destinadas à preservação dos anti-microbianos.

No fundo, o importante é proteger antibióticos e anti-microbianos. Por todos os meios. Só devem ser utilizados quando são mesmo necessários e apenas por prescrição médica ou de médicos veterinários.

Quer para tratar doenças das pessoas ou dos animais a indisciplina no uso de anti-microbianos favorece o contacto destes com os micróbios patogénicos e, assim, proporciona a indução de resistências que geneticamente são transmitidas a futuras gerações desses mesmos micróbios (transmissão que não teria lugar se os anti-microbianos não tivessem sido utilizados abusivamente).

PS. O autor das crónicas de quarta-feira estará de férias em Agosto, motivo pelo qual só voltará às páginas do DN a partir do dia 6 de Setembro.

Durante esses dias irá, alternadamente, para as Azenhas do Mar e para Vila Real de Santo António. O microclima das Azenhas funciona como um imenso ar condicionado natural, visto que aí raramente faz calor.

É um ambiente próprio para leituras e passeios refrescantes. No Algarve, terá sempre em atenção os riscos de exposição aos raios solares e não irá à praia entre as 12.00 e as 16.00 horas. Usará chapéu com abas largas, óculos escuros, T-shirt e protectores solares.

Para além de estar com a família, encontrar-se-á com amigos em jantares, já, aliás, aprazados, e com mesas reservadas nos restaurantes habituais.

Então, terão lugar discussões e trocas de pontos de vista sobre livros e filmes. A guerra, a paz e as crises políticas na Europa e em Portugal não escaparão às conversas. O desempenho dos diferentes governantes será, também, revisto.

Ex-director-geral da Saúde
franciscogeorge@icloud.com

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Francisco George
26 Julho 2023 — 00:21


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264: A Era dos Antibióticos (IV)

 

🇵🇹 OPINIÃO

Em continuação dos três artigos já escritos sobre o mesmo assunto, acentuam-se hoje os aspectos essenciais de protecção dos antibióticos e de outros medicamentos anti-microbianos, que estão agora em risco de perderem eficácia.

Antes de tudo, sublinhe-se que a ocorrência de resistência não é exclusiva de bactérias em relação aos antibióticos. Igualmente, os vírus, tal como os protozoários ou os fungos podem desenvolver resistências, respectivamente, aos antivirais, ou a antipalúdicos (no caso do paludismo), ou a antifúngicos.

Por isso, é mais correto falar de resistência dos agentes microbianos patogénicos aos ANTI-MICROBIANOS, uma vez que a expressão antibiótico refere-se só a bactérias (anti-bacteriano).

Ora, os medicamentos anti-microbianos são utilizados no tratamento de doenças, tanto provocadas por bactérias, por vírus, protozoários ou por fungos.

A nível internacional, este problema da RESISTÊNCIA é designado pela sigla AMR que em inglês significa antimicrobial resistance.

Remonta a 2008 a confirmação de casos de resistência do vírus da gripe ao antiviral oseltamivir. Por outro lado, também desde há muito, foram identificados protozoários, agentes do paludismo, resistentes a antipalúdicos como a cloroquina, por exemplo.

Reconhece-se, do mesmo modo, um problema com fungos patogénicos que provocam doenças (como as candidíases) que apresentam resistências aos medicamentos clássicos.

A actual comprovação que as taxas dos micróbios resistentes aos anti-microbianos são cada vez mais elevadas é motivo de grande preocupação.

Estão em causa os medicamentos para a prevenção e tratamento de doenças de natureza bacteriana, ou viral, ou devidas a protozoários ou, também a fungos. A apreensão a nível nacional e global é justificada, visto que são fenómenos que constituem desafios para a Humanidade.

Naturalmente, a aplicação de medidas preventivas das Resistências aos Anti-microbianos (RAM) impõe prévio conhecimento da sua génese. Ver-se-á que a luta contra as resistências envolve cidadãos e governantes, bem como todos os sectores relacionados com a Saúde Humana, Animal, com a Agricultura e o Ambiente. Implica, pois, a abordagem ONE HEALTH.

Precise-se.
A utilização inapropriada de anti-microbianos em medicina ou veterinária ou, ainda, na agricultura favorece, comprovadamente, o aparecimento de resistências devido a mecanismos de selecção, já mencionados.

São exemplos de indevida utilização: o consumo excessivo (por tudo e por nada tomar um antibiótico…); o não-cumprimento da prescrição médica (acabar a toma antes de tempo); o uso de antibióticos para infecções virais, quer de seres humanos ou animais…

O panorama na pecuária e agricultura não é tranquilo, porque muitos dos agentes microbianos patogénicos são comuns a seres humanos e animais. Se esses micróbios forem resistentes, assim continuarão sempre a ser.

Repita-se. Se o micróbio patogénico adquirir resistência, as futuras gerações do mesmo micróbio serão resistentes aos respectivos anti-microbianos, quer em seres humanos, quer animais. A sua propagação é pandémica.

É urgente mudar de comportamentos no que respeita ao consumo de anti-microbianos. Mesmo admitindo que outros anti-microbianos inovadores sejam produzidos pela Indústria Farmacêutica, se os comportamentos não mudarem as resistências continuarão depois a ocorrer novamente.

Continua no capítulo V.

Ex-diretor-geral da Saúde
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Francisco George
19 Julho 2023 — 00:23



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232: A Era dos Antibióticos (II)

 

🇵🇹 OPINIÃO

Já aqui foi resumida, em artigo anterior, a história da descoberta da penicilina, em 1928, pelo médico escocês Sir Alexandre Fleming. A este propósito, sublinhou-se que a penicilina foi colocada no mercado pela Indústria Farmacêutica, apenas em 1941.

Viria, desde então, a tratar, curar e salvar muitos milhões de doentes, em todo o mundo, diagnosticados com problemas de infecções bacterianas que anteriormente não dispunham de tratamento específico.

Cedo, porém, foram identificadas certas estirpes de bactérias que tinham adquirido resistência à penicilina, fenómeno que ainda foi observado por Fleming antes da sua morte, ocorrida em 1955.

Para compreender o aparecimento, inicialmente inesperado, de bactérias resistentes é preciso, antes de tudo, destacar que a característica da resistência reside na própria bactéria e não no doente.

É, assim, inteiramente errada a ideia que alguns doentes poderão ainda ter no sentido de julgarem que, devido ao facto de quase nunca tomarem antibióticos, quando os tomam eles fazem rapidamente efeito…

Opinião errada, saliente-se novamente. Ora, o efeito ou a eficácia de determinado medicamento antibiótico não tem qualquer relação com os hábitos anteriores do doente que é medicado para combater uma infecção de origem bacteriana.

A acção do antibiótico está unicamente relacionada com a bactéria que provoca a infecção, que precisa de ser devidamente tratada e curada. É o agente bacteriano que pode ser sensível ou resistente ao antibiótico. Se for sensível a cura da infecção será certa.

Se a bactéria for resistente ao antibiótico não fará qualquer efeito terapêutico. Neste caso a infecção pode agravar-se, ou complicar-se e evoluir para a cronicidade ou, mesmo, levar à morte do doente.

Imagine-se, o seguinte cenário, aliás muito provável: um cidadão de 40 anos de idade, em plena saúde aparente, sai do seu local de trabalho em Lisboa e, ao final do dia, regressa a sua casa no Seixal, onde reside com mulher e dois filhos, um deles recém-nascido.

Ao entrar no barco, no Cais do Sodré, para atravessar o Tejo, à hora de “ponta”, inala passivamente as gotículas da tosse de um passageiro que estava a seu lado, apertado, na mesma fila.

Imagine-se, também, que essas gotículas continham bactérias de tipo estreptococos, resistentes à penicilina, que o tal passageiro tinha alojadas na sua orofaringe e que as transmitiu ao outro que estava junto de si…

São incidentes de situações, análogas à agora descrita, que devem estar presentes no pensamento de todos os cidadãos. Mas, mais do que isso, devem guiar os comportamentos, de molde a prevenir riscos facilmente evitáveis.

Nesta circunstância, o passageiro a caminho de casa devia estar protegido ou ter evitado as horas com mais aglomerações de pessoas e o outro, ao tossir, teria de ter observado as normas de etiqueta respiratória aconselhadas pela Direcção-Geral da Saúde.

Por outro lado, os serviços de Saúde Pública têm de continuar a insistir na difusão de conselhos destinados à prevenção e controlo de infecções respiratórias.

A seguir, em artigo próximo, procurar-se-á esclarecer a génese do aparecimento da resistência de bactérias aos antibióticos, bem como as principais medidas que visam reduzir o problema na perspectiva ONE HEALTH que envolve, necessariamente, a saúde humana, animal e a agricultura.

Ex-director-geral da Saúde
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Francisco George
05 Julho 2023 — 00:27



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215: A Era dos Antibióticos (I)

 

🇵🇹 OPINIÃO

Desde há muitos anos os especialistas em Saúde Pública, tanto em Portugal como a nível mundial, chamam a atenção para a necessidade em preservar os antibióticos e clamam pela adopção de medidas para evitar o desastre, que se avizinha, devido à crescente propagação da resistência das bactérias. Um imenso desafio para a Humanidade.

Hoje, aqui, procurar-se-á resumir a história da descoberta dos antibióticos e dos problemas que, pouco depois, foram identificados com a sua utilização.

O novo tempo teve início em 1928 com as pesquisas do cientista Alexandre Fleming.

Fleming nascera na Escócia, em 1881, e viria a concluir Medicina na Universidade de Londres aos 25 anos de idade. Serviu na I Guerra Mundial nas frentes em França, como médico militar, onde presenciou a elevada mortalidade devida à falta de tratamento para as infecções adquiridas pelos soldados feridos durante os combates. Na altura, estava bem longe de pensar que seria ele mesmo a descobrir o primeiro antibiótico.

Mas, assim aconteceu. Um dia, em Londres, ao regressar ao seu laboratório do Hospital de St Mary, observou, acidentalmente, que os bolores que espontaneamente tinham crescido na placa onde ele, dias antes, tinha cultivado bactérias de tipo estafilococos, impediam o desenvolvimento das mesmas bactérias ao seu redor.

Logo deduziu que nos bolores estaria uma substância com propriedades que eliminavam as colónias bacterianas. Assim foi. Trabalhou muito desde então. Comparou culturas. Fez ensaios. Investigou essas propriedades bactericidas.

Como os bolores eram fungos da espécie Penicillium notatum designou essa substância com o nome de PENICILINA. No ano seguinte, em 1929, publicou os seus estudos com os resultados da acção anti-bacteriana do líquido obtido a partir dos bolores do género Penicillium.

Entretanto, a substância isolada por Fleming foi purificada e sintetizada por especialistas em bioquímica na perspectiva da sua utilização como medicamento antibiótico.

Passaram 10 anos até ao início da produção industrial de Penicilina nos Estados Unidos da América. Um sucesso a partir de 1941.

Em 1945, Fleming recebeu o Prémio Nobel da Medicina, juntamente com o farmacêutico australiano Howard Florey e com o bioquímico alemão Ernest Boris Chain que conduziram o processo de preparação da penicilina destinada a ser utilizada como o primeiro antibiótico.

A Penicilina, antibiótico natural, passou a ser produzida a nível mundial como Benzilpenicilina (Fleming não patenteou a sua descoberta). Como o ácido clorídrico do estômago inactiva a Penicilina, inicialmente, era apenas administrada através de injecções endovenosas ou intra-musculares.

A seguir, os cientistas das grandes empresas farmacêuticas conseguiram preparar derivados da Penicilina para prolongar a sua acção e alargar o espectro. Foi, igualmente, possível preparar a sua administração por via oral.

Sir Alexandre Fleming é justamente considerado uma das 100 mais importantes personalidades do Século XX. Viria a morrer em 1955. Antes, porém, ainda assistiu ao aparecimento de bactérias que resistiam à sua Penicilina.

Moral:
É difícil conceber a vida sem antibióticos. Imaginem-se doenças sem terapêutica: sífilis, gonorreia, escarlatina, amigdalite, glomerulonefrite, endocardite, pneumonia, difteria, meningite bacteriana…

É obrigatório tudo fazer para evitar andar para trás!

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franciscogeorge@icloud.com

D.N.
Francisco George
28 Junho 2023 — 00:15



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197: Portugal, 1974 (III)

 

🇵🇹 OPINIÃO

No princípio de Maio, os primeiros passos de convivência colectiva em democracia foram surpreendentes. Naturalmente, com alguns excessos, mas sempre admiráveis.

Sintetizam-se, a seguir, dois temas, de melindre indiscutível. Ambos foram alvo de acesos debates ao longo do mês: um com grande repercussão “na rua” reflectida nos meios da Imprensa e o outro no interior dos gabinetes da Junta de Salvação Nacional, da Comissão Coordenadora do MFA e nos conselhos de ministros do I Governo Provisório.

Precisem-se.

1 – Nesta fase inicial da nova Era, a História era assinalada a quase a todas as horas. Acontecimentos marcantes, muitas vezes, ocorriam de manhã e outros, igualmente importantes, à tarde ou à noite. Era preciso estar sempre a ouvir notícias.

Na altura, dias havia que dormir era difícil, sobretudo se coincidiam com reuniões do MFA ou da Junta de Salvação Nacional. Nesses tempos, as noites eram diferentes. Em regra, encurtadas por sobressaltos inesperados (umas vezes eram apenas rumores outras eram eventos com relevo).

A este propósito, o então primeiro-ministro, Adelino da Palma Carlos, contou durante uma entrevista que chegara a receber telefonemas às 3 horas da manhã de António Spínola que começava por perguntar “se já estaria a dormir” …

Portugal era, na época, governado por “homens sem sono”, como se dizia nas redacções dos jornais. Os dias eram longos e as noites de descanso demasiado curtas. Um reboliço permanente.

Logo na primeira semana de Maio começaram as ocupações das casas devolutas ou subaproveitadas. Neste sentido, o frenesim da agitação popular, eminentemente urbano, teve lugar em Chelas, no famoso Bairro da Boavista, onde vinte e três blocos de habitações foram ocupados por gente pobre. Antes do final do mês, verificou-se no Porto a ocupação de casas no Bairro São João de Deus.

Os “capitães” viam as ocupações com surpreendente simpatia. Algumas semanas depois, eram os próprios militares do COPCON que intervinham nas disputas que se multiplicavam por todo o lado. Mas, invariavelmente, colocavam-se do lado dos ocupantes com espantosa genuinidade.

As forças da Polícia de Segurança Pública (PSP) e da Guarda Nacional Republicana (GNR) eram dispensadas destas intervenções, atendendo à manifesta cumplicidade, ainda recente, com o regime deposto.

Repetiram-se cenas semelhantes que tinham grande cobertura mediática. A simpatia pelos ocupantes era generalizada.

2 – O outro assunto principal referia-se à indecisão sobre o reconhecimento da Independência da Guiné-Bissau que tinha sido proclamada, unilateralmente, em 24 de Setembro de 1973 nas matas das colinas do Boé pelos dirigentes do PAIGC, herdeiros de Amílcar Cabral.

As pressões para o Governo Português reconhecer a nova República eram imensas. Entidades de credibilidade insuspeita como o Conselho Mundial das Igrejas e as Nações Unidas (ONU) e, a nível bilateral, os países aliados de Portugal, incluindo a Inglaterra, insistiam na necessidade premente em ser reconhecida a Independência da Guiné-Bissau e em iniciar a descolonização. Ninguém ignorava que a ligação emocional de Spínola à Guiné iria representar um obstáculo.

No dia 25, em Londres, têm lugar as conversações formais com o PAIGC. Logo depois os conflitos armados terminaram.

Moral:
O mês de Maio, inaugurado pelas magníficas festas do seu primeiro dia, foi histórico.

Ex-director-geral da Saúde
franciscogeorge@icloud.com

D.N.
Francisco George
21 Junho 2023 — 00:34


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176: Portugal, 1974 (II)

 

🇵🇹 OPINIÃO

© D.R. / Álvaro Cunhal

Logo em Maio e Junho, os assuntos relacionados com as então Colónias Portuguesas eram os temas centrais nas discussões havidas durante as sessões do Conselho de Ministros, desde o I Governo Provisório.

Aliás, compreende-se que assim tivesse acontecido, uma vez que a Guerra Colonial esteve na génese do Movimento das Forças Armadas (MFA).

Cedo os “capitães” compreenderam que para acabar a Guerra em África impunha-se derrubar pela força o governo de Marcelo Caetano. Por outro lado, depois da Revolução, concluíram que para terminar a guerra era preciso descolonizar.

O reconhecimento da independência de cada colónia seria, portanto, inevitável. Era o tópico principal em debate nas Forças Armadas e no Governo Provisório.

As notas pessoais que Adelino da Palma Carlos registava no seu caderno pessoal,* durante cada reunião do Conselho de Ministros, espelham essa imensa preocupação com as situações políticas e militares relacionadas com as Colónias Portuguesas, designadamente Guiné, Angola e Moçambique.

© D.R. / Álvaro Cunhal

Ainda em 1974, devido a inconciliáveis discordâncias com o rumo político decidido no sentido da descolonização, tanto Adelino da Palma Carlos, como António Spínola renunciaram aos cargos que desempenhavam de primeiro-ministro e de Presidente da República.

Como se sabe, o processo de descolonização prosseguiu com determinação e de forma rápida. Mário Soares nos Negócios Estrangeiros, António Almeida Santos no antigo Ministério do Ultramar (que passou a designar-se de Coordenação Inter-territorial), Vasco Gonçalves (a partir do II Governo Provisório) e Melo Antunes (membro da Comissão Coordenadora do MFA) cumpriram papéis primordiais.

Os Conselhos de Ministros eram muito longos. Por vezes, começavam pela manhã e prolongavam-se até à noite. Demoravam muitas horas.

À mesa do Conselho, Álvaro Cunhal, ministro sem pasta, tinha o costume de desenhar. A seu lado, sentava-se António Almeida Santos que observava com estupefacção a facilidade e o prazer, bem visíveis, de Cunhal ao retratar figuras populares ao estilo neo-realista.

Um desses retratos, oferecido a Almeida Santos, é agora publicado pela primeira vez.**

Moral da história:
O desenho que Álvaro Cunhal fez, em 1974, durante o Conselho de Ministros e que no final ofereceu a António Almeida Santos, poderá representar uma camponesa serrana de Seia, onde os dois nasceram, respectivamente em 1913 e 1926.

A questão que se coloca é saber se desenhar ajuda a passar o tempo ou se, também, estimula o pensamento?

* Notas publicadas por Helena Sanches Osório, em 1988.
** Colecção particular do autor.

Ex-director-geral da Saúde
franciscogeorge@icloud.com

D.N.
Francisco George
14 Junho 2023 — 00:26

– É meu parecer que esta crónica estaria melhor enquadrada a partir de um Historiador…

 


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154: Portugal, 1974 (I)

 

🇵🇹 OPINIÃO

A História da República, em 1974, aclama acontecimentos exaltantes e de tamanha grandeza que a prosa não consegue descrever com a necessária atracção.

Sem prejuízo de outros retratos objectivos, baseados em rigorosa análise histórica, relatam-se aqui episódios dispersos que podem alcançar alguma satisfação à curiosidade de leitores interessados pelas narrações e testemunhos da época.

Em Maio, as primeiras escolhas políticas recaem em democratas conservadores. Foi o caso da nomeação de Adelino Palma Carlos para Primeiro-ministro por proposta insistente do Presidente António Spínola.

Adelino era um conhecido professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, contemporâneo e amigo de Marcelo Caetano (ambos com idades próximas). Desde cedo aderiu à Maçonaria Portuguesa, tendo mesmo sido grão-mestre do Grande Oriente Lusitano.

Aliás, foram os dirigentes maçónicos que logo sugeriram o seu nome a Spínola. Tinha sido Director da Faculdade e Bastonário da Ordem dos Advogados.

Nos tribunais, Palma Carlos não hesitava em defender os políticos opositores à Ditadura do Estado Novo, perseguidos pela PIDE.

Foi primeiro-ministro do I Governo Provisório durante dois meses, a partir de 16 de maio. Como se sabe, o ambiente político da altura era muito especial. Sempre quente. Instável. Complexo, sem dúvida, mas exaltante.

A antiga amizade que unia Marcelo e Adelino facilitou a comunicação entre eles, mesmo depois da inesperada substituição ocorrida.

Trocam cartas para combinarem o destino de documentação existente em São Bento, incluindo associada a livros de cheques que tinham ficado por resolver.

Com a posterior publicação dessa correspondência ficou a saber-se que o Presidente do Conselho dispunha de uma conta no Banco Espírito Santo destinada a fins assistenciais de acções de benemerência (como pequenos donativos).

Curiosamente, essa conta era abastecida regularmente pela Fundação Calouste Gulbenkian.

Ora, imediatamente antes da entrada em funções de Adelino Palma Carlos, na véspera, foi publicado o Decreto-lei 203/1974 de 15 de Maio que transforma o Programa do Movimento das Forças Armadas (MFA) em Lei, publicada no então “Diário do Governo”.

No capítulo da política social prevê “o lançamento das bases para a criação de um serviço nacional de saúde ao qual tenham acesso todos os cidadãos”.

Melo Antunes e os outros membros da Comissão Coordenadora do MFA, conheciam a precariedade da situação de Saúde Pública. Sabiam do atraso de Portugal em relação à Europa.

O país ainda vivia o tempo das epidemias de cólera. A mortalidade infantil era 4 vezes superior à da Suécia. A esperança de vida ao nascer era inferior em 7 anos quando comparada com a da Suécia. Em 1974, 1 em cada 4 portugueses não atingia 55 anos de idade.

Em resumo, em Portugal, os cidadãos morriam cedo e tinham esperança de viver mais curta em comparação com outros países europeus. Viviam com pouca qualidade e morriam prematuramente devido a causas evitáveis.

Moral

A construção do Serviço Nacional de Saúde foi prevista pelo MFA e inscrita como prioridade no Programa apresentado em 25 de Abril.

Os capitães sabiam que era inadiável. Agora, na preparação das celebrações dos 50 anos, o Serviço Nacional de Saúde deve continuar a ser prioridade, ao lado da Escola Pública e da Justiça. Era essa a ambição do MFA.

franciscogeorge@icloud.com

D.N.
Francisco George
07 Junho 2023 — 00:22


Web-designer, Investigador
e Criador de Conteúdos Digitais


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131: Duelos

 

🇵🇹 OPINIÃO

É preciso falar sobre os desafios para a Saúde Pública porque representam motivos de preocupação para todos. É necessário conhece-los a fim de serem eliminados a tempo. É indispensável a mobilização geral para estas lides inadiáveis.

Só assim, o futuro poderá ser vivido com confiança. Prevenir é, também, uma questão de inteligência. Firmeza. Ainda mais quando são as gerações seguintes que devem ser protegidas através de medidas tomadas hoje. Agora.

Por isso mesmo, desafios e sustentabilidade estão interligados. São convergentes, visto que o que acontece hoje reflecte-se necessariamente amanhã.

Eis três principais ameaças para o futuro:

1. As actuais alterações climáticas têm consequências para a Saúde Pública relacionadas com o aquecimento global. Têm que ser enfrentadas. Um confronto que não pode ser adiado.

Ora, está demonstrado que o efeito de estufa provocado pela libertação de gases poluentes, associados, sobretudo, à produção de energia, traduz-se pelo aumento da frequência de fenómenos climáticos extremos: ondas de calor, secas prolongadas, ciclones, cheias, etc.

Por outro lado, o aumento da temperatura ambiente cria condições favoráveis à multiplicação de vectores (artrópodes) que podem transmitir doenças como o zika, febre de dengue, febre amarela, paludismo, além de outras infecções.

Para desacelerar este processo de transição climática é urgente a adopção de medidas exigentes, em especial no que se refere à utilização de energias.

Para tal, cabe ao Estado, em conjunto com a população, promover o desenvolvimento de estratégias baseadas no binómio: libertar menos carbono & capturar o carbono libertado.

2. A crescente resistência dos microrganismos patogénicos aos anti microbianos, designadamente de bactérias em relação a antibióticos, de vírus a antivirais e de protozoários aos antipalúdicos, estão a gerar dificuldades de tratamento das doenças infecciosas.

O uso indevido de antibióticos em Medicina Humana ou Animal e Agropecuária está na origem deste fenómeno. Sabe-se que os plasmídeos que provocam a resistência aos antibióticos são fragmentos soltos de material genético (ADN) que se transmitem a novas gerações das bactérias e outras espécies de bactérias e que se encontram no ambiente (como a água).

3. As doenças crónicas têm na sua génese os comportamentos como denominador comum. Os cenários relativos à transição epidemiológica e as suas relações com o envelhecimento da população acentuam a oportunidade em promover acções de redução da magnitude destas doenças.

Cancro, doenças cérebro-cardiovasculares, diabetes, obesidade e doenças respiratórias retratam esses problemas. É importante fomentar a adopção de comportamentos promotores de saúde ao longo do ciclo de vida e atender às determinantes básicas: ALIMENTAÇÃO que tem que ser equilibrada no plano quantitativo de calorias ingeridas e na composição (menos açúcares, menos sal, menos gorduras); EXERCÍCIO FÍSICO, combatendo hábitos sedentários desde a infância (os pais devem impedir os filhos de ficarem horas à frente de monitores de TV ou de computador e voltarem aos parques para andarem de triciclo, trotineta ou bicicleta); TABAGISMO, reduzindo o consumo convencional ou de tabaco aquecido.

Moral:

No futuro, a redução dos riscos de saúde irá depender das acções concretas que hoje são tomadas. Depois será tarde proteger filhos e netos. Agora ou nunca!

Ex-director-geral da Saúde
franciscogeorge@icloud.com

D.N.
Francisco George
31 Maio 2023 — 00:43


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