– “… E não me refiro só aos clientes, mas também a quem os serve e que decide, por direito legal, aplicar as normas de funcionamento internas que bem entender no seu estabelecimento.”
Embora as leis permitam, em certos casos específicos, algumas irregularidades, com falta de sensibilidade e de bom senso à mistura e pelo facto de entender não acatar normas ditatoriais pessoais, mesmo que “legais”, sejam elas em que área social forem, é que, neste contexto, deixei de frequentar restaurantes. Simples!
🇵🇹 OPINIÃO
Quando por estes dias continuo a ouvir e a ler comentários sobre alegados “valores abusivos” cobrados por restaurantes, vem-me à memória o título da obra da inglesa Jane Austen. Se nesta matéria é preciso muito bom senso, não é menos necessário um mínimo de sensibilidade.
E não me refiro só aos clientes, mas também a quem os serve e que decide, por direito legal, aplicar as normas de funcionamento internas que bem entender no seu estabelecimento.
Antes de mais, e quando se trata do que um restaurante ou outro estabelecimento similar cobra aos seus clientes, devo lembrar que existe um Regime Jurídico de Acesso e Exercício de Actividades de Comércio, Serviços e Restauração, expresso no Decreto-Lei n.º 10/2015, de 16 de Janeiro.
Tal regime determina que as normas de funcionamento devem estar devidamente publicitadas e afixadas num local destacado e bem à vista de quem entra para consumir.
Logo, quem serve, não só tem de cumprir a lei, como deve aplicar uma dose de bom senso e outra de sensibilidade a fim de informar convenientemente os seus clientes.
Cobrar dinheiro por se aquecer um folhado no micro-ondas ou por se utilizar uma faca para cortar um qualquer alimento ao meio a pedido do cliente foram algumas das situações cujos relatos li em algumas notícias e que também se tornaram quase virais nas redes sociais.
Sobre normas como estas, não tenho dúvidas, não cumprem o mínimo da sensatez. Mas, volto a recordar, se estiverem afixadas podem ser aplicadas, a menos que não pressuponham qualquer contrapartida de um serviço. Todavia, resta ao cliente decidir se volta a entrar no mesmo estabelecimento ou não.
Também ouvi e li histórias cujas personagens principais eram rodelas de limão e cubos de gelo. E outras sobre valores cobrados por utilização de loiças. Nestes casos, e mesmo sendo cliente, devo dar uma dose de sensibilidade.
Afinal, para servir a rodela de limão e o cubo de gelo, ou para pôr na mesa 20 ou 30 pratos, mais talheres e copos para que o grupo possa comer o bolo do aniversariante e brindar com o champanhe, a verdade é que, nestes casos, o estabelecimento terá algum custo.
Porque comprou os limões, o gelo e porque tem de fazer a limpeza e higienização da loiça utilizada com um produto que foi adquirido num outro estabelecimento e no fundo está a prestar serviços.
Confesso que, a mim, nunca me aconteceu receber tais “valores extras” na factura, mas a verdade é que são legais, assim a lei seja cumprida. Mais, deixo aqui o alerta para o facto de todos estes valores, que são incomuns, terem de constar na factura e ser devidamente identificados nos termos do Código do IVA.
Outra chamada de atenção vai para os copos de água da torneira que, esses sim, não podem, porque a lei já não o permite, serem cobrados a quem os consome no estabelecimento. Este, por sua vez, é obrigado a disponibilizar gratuitamente aos seus clientes um recipiente com água da torneira e copos não descartáveis e higienizados.
Normas e burocracias à parte, acredito sempre que quem serve, quer sempre fazê-lo da melhor maneira, com bom senso, não cobrando por cobrar.
Da minha parte, enquanto cliente, insisto na sensibilidade que também devo ter para entender que, quando peço algo extra, esse extra não aparece do nada, tem uma origem e um custo associado.
Logo, se é um custo pode ser cobrado, sem que isso signifique um “abuso”. Admito que pode ser insensato, mas abusivo não.
O cliente, volto a referir, é livre de escolher entrar novamente, ou não, no estabelecimento que lhe cobrou pela rodela de limão ou pelo cubo de gelo, como também é livre de decidir entrar num outro estabelecimento que aplique o já mais habitual “consumo mínimo”.
É que se queremos falar sobre abusos, manda o bom senso que se traga a lume o abuso da inflação galopante, sobretudo dos produtos alimentares, que, apesar de mais baixa, ainda não acompanha a inflação geral e obriga as empresas a suportar este desequilíbrio sem aumentar os preços.
É que se a carteira dos clientes se tem esvaziado com o aumento do custo de vida, o mesmo acontece com as tesourarias das empresas, que aumentam, dia após dia,o esforço para manter os preços dos menus.
Como no velho romance de Austen, de 1811, em que as irmãs Elinor e Marianne viviam em busca do equilíbrio entre a razão e a emoção, não me parece demais aplicar o desafio quando nos sentamos à mesa.
Haja sensibilidade e bom senso, de quem serve, de quem compra, mas também de quem tem na mão a faca e o queijo para evitar ou amenizar os abusos, que, entenda-se, não são provocados pelo cubo de gelo ou pela rodela de limão.
Secretária-geral da AHRESP – Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal
DN
Ana Jacinto
13 Setembro 2023 — 00:55
Ex-Combatente da Guerra do Ultramar, Web-designer,
Investigator, Astronomer and Digital Content Creator
published in: 1 semana ago