🇵🇹 OPINIÃO
Se o sucesso de um país se medisse pela visibilidade mediática do líder então a Coreia do Norte destacar-se-ia no grupo dos mais desenvolvidos e ricos.
Mas infelizmente para os 26 milhões de norte-coreanos a cimeira agora de Kim Jong-un com o russo Vladimir Putin valerá tão pouco em termos práticos como aquelas que aquele teve há uns anos com o americano Donald Trump.
A Coreia do Norte continua um país isolado do resto do mundo, e é incomparavelmente mais pobre do que a Coreia do Sul, cujos líderes são discretos, mas muito mais eficazes a governar.
Foram agora publicados em Portugal dois livros sobre os coreanos que nos ajudam a perceber a importância do Paralelo 38, a linha divisória instituída no final da Segunda Guerra Mundial para a rendição das tropas japonesas: a norte aos soviéticos, a sul aos americanos.
Mesmo depois da Guerra da Coreia de 1950-1953, o primeiro grande conflito da Guerra Fria, a fronteira segue aproximadamente a linha riscada num mapa da revista National Geographic por um oficial americano.
Um dos livros conta a história das duas Coreias (Coreia: Uma breve História do Norte e do Sul, de Victor Cha e Ramon Pacheco Pardo, editado pela Ideias de Ler) e o outro o da Coreia do Sul (Breve História da Coreia do Sul, de Ramon Pacheco Pardo, edição Vogais). Por coincidência, como salta à vista, um autor assina uma das obras em conjunto e a outra a solo.
Até 1945, houve uma só História da Coreia, apesar de em eras antigas ter chegado a haver vários reinos na Península Coreana. Durante seis séculos até 1910 governou a dinastia Joseon, que fechou o país ao mundo, e de 1910 a 1945 deu-se a colonização japonesa. Com a Guerra Fria nasceram duas Coreias inimigas, uma comunista, a outra capitalista, mas ambas ditaduras.
Depois da tentativa falhada de reunificação pela força por Kim Il-sung, avô do actual líder norte-coreano, tanto o Norte como o Sul estavam destruídos, mais até o Sul.
Mas as décadas seguintes a 1953 fizeram toda a diferença: enquanto o Norte se transformou num regime comunista dinástico, fortemente militarizado, o Sul evoluiu para uma democracia, construída pelas reivindicações populares e alicerçada num grande crescimento económico.
Os testes de mísseis norte-coreanos e os ensaios nucleares podem encher as páginas dos jornais, mas não enchem os pratos das famílias, com fomes ocasionais quando as colheitas são más.
Já as empresas sul-coreanas (simbolizadas pela Samsung, LG ou Hyundai) conquistam cada vez mais os mercados mundiais e garantem que os 51 milhões de sul-coreanos, cujo presidente eleito em 2022 se chama Yoon Suk Yeol, possuam um dos mais altos níveis de desenvolvimento humano.
Noutros séculos, a Coreia conseguiu manter a independência apesar de vizinhos poderosos, como a China e o Japão. Depois potências como os Estados Unidos e a União Soviética/Rússia passaram também a envolver-se nos destinos da Península.
Cimeiras ocasionais entre os líderes de Pyongyang e de Seul têm alimentado a possibilidade de verdadeira paz, de certa cooperação e até de uma reunificação a longo prazo, mas são mais os momentos de tensão do que os de acalmia ao longo do Paralelo 38 e este aproximar de Kim a Putin – depois de Joe Biden ter há semanas reforçado a cooperação militar entre os Estados Unidos, o Japão e a Coreia do Sul – mostra que Pyongyang e Seul seguem a linha tradicional de divisão ideológica no actual choque entre a Rússia e o Ocidente, afastando-se uma da outra.
Visitei três vezes a Coreia do Sul, enquanto da Coreia do Norte só conheço o que vi em Panmunjon, nome da antiga aldeia onde o armistício de 1953 foi assinado e onde agora estão os pavilhões azuis que servem para negociações.
Mas não tenho dúvidas de que a pujança da cultura coreana e a criatividade do povo coreano se reflecte muito mais no Sul, incomparavelmente mais, mesmo que seja surpreendente a capacidade norte-coreana para produzir tecnologia militar.
E recomendo a quem quiser conhecer um pouco mais este povo extraordinário que vá dia 23 ao Museu de Lisboa no Palácio Pimenta conhecer a Festa da Cultura Coreana, com gastronomia típica, Taekwondo, K-Pop e muito mais. Está aberta a todos, como a admirável Coreia do Sul.
Director adjunto do Diário de Notícias
DN
Leonídio Paulo Ferreira
14 Setembro 2023 — 00:06
Ex-Combatente da Guerra do Ultramar, Web-designer,
Investigator, Astronomer and Digital Content Creator
published in: 1 semana ago