SAÚDE PÚBLICA // LONGO COVID
A OMS decretou o fim da pandemia três anos depois do seu início, mas com um alerta especial para o Longo Covid, tendo mesmo avançado com um plano de abordagem de emergência para a doença. E aconselhou os países a fazerem o mesmo.
Em relação a Portugal, o pneumologista Filipe Froes diz ao DN não haver outra alternativa senão a da criação de um plano nacional, para que estes doentes sejam tratados de forma estruturada, ao mesmo tempo que se optimiza recursos e se garante a sustentabilidade dos serviços de saúde.

OMS diz que continua a haver pessoas a lutar nas UCI contra a Covid-19 e que vigilância não pode abrandar.
Na quarta-feira, a Organização Mundial de Saúde anunciou ter um novo plano global para a gestão da covid-19 até 2025, por causa dos milhões de casos de Longo Covid que “vão continuar a necessitar de cuidados médicos”.
Na quinta-feira, assumiu manter-se a tendência de há meses, que é a de redução de mortes, mas alertando para o facto de ainda haver alguma incerteza sobre o vírus – aliás, frisou bem que um dos erros que está ser cometido pelos países é o de estarem a baixar a guarda na monitorização e na vigilância.
Um alerta que levou alguns especialistas a considerarem que, afinal, não era agora que se iria colocar um ponto final no estado de emergência à escala global, mas, 24 horas depois, ao início da tarde de ontem, em Genebra, o director-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, veio confirmar este mesmo cenário, dizendo que tinha aceite a recomendação do Comité de Emergência, declarando assim “o fim da emergência de saúde para a covid-19 a nível global”.
O pneumologista e ex-coordenador do Gabinete de Crise para a Covid-19 da Ordem dos Médicos, Filipe Froes, explicou ao DN que os passos dados pela OMS, durante este semana, foram no sentido de alertar os países que, em primeiro lugar, “o Longo Covid é a grande herança deixada pelo SARS-CoV-2”, em segundo que, “apesar da melhoria epidemiológica à escala global, a menor monitorização da doença, sobretudo nos países mais desenvolvidos, e, em particular, nos EUA e na Europa, pode estar a dar um retrato menos adequado da doença, e que é preciso manter os sistemas de vigilância”, para eventuais respostas ao aparecimento de novas variantes mais perigosas. E, em terceiro lugar, que “a situação epidemiológica pode ser gerida país a país”. Por isso mesmo, decretou “o fim da pandemia”.
Mas, no entender de Filipe Froes, há um alerta que nenhum país pode descurar e, esse, é o da abordagem à nova doença que é o Longo Covid, nomeadamente Portugal, porque, “segundo os dados da OMS, estima-se esta esteja a atingir, em média, 6% dos infectados, o que significa que no nosso país, e se tivermos em conta os 5,5 milhões de casos registados, que já há entre 330 mil a 350 mil doentes.
É um dado brutal em termos de cuidados assistenciais nos serviços de saúde”. O médico reforça mesmo que, ao fazer este alerta, “a OMS está a dizer aos países que o Longo Covid é uma grande preocupação sua e que vai ser uma das maiores sobrecargas a nível dos cuidados assistenciais nos serviços de saúde, os quais, em muitos países, já estão debilitados pela luta contra a pandemia durante os últimos anos “.
Portugal, por exemplo, reforça o médico, “foi dos países que teve menor capacidade assistencial não covid durante a pandemia e, agora, vai ter de lidar com a nova doença”.
Por isso mesmo, defende, tanto o nosso país como outros, na mesma situação, “não têm outra alternativa senão fazerem o que a OMS recomenda, que é criar condições para avançarem com um plano nacional para a abordagem do Longo Covid. Senão, arriscam-se a tratar estes doentes de uma forma não estruturada, com piores resultados e com maior consumo de recursos”.
Na sua opinião, “a criação de um plano nacional permitirá tratar melhor estes doentes, com melhor utilização de recursos, garantindo a sustentabilidade do SNS.”
Filipe Froes destacou que a existência de um plano nacional para o tratamento dos doentes com Longo Covid é fundamental, não tanto pelos doentes que podem continuar a aparecer – embora em menor número – porque há factores que têm reduzido o risco de desenvolvimento de Longo Covid, como a vacinação, o uso de antivirais no tratamento e a própria evolução do vírus, mas “pelos doentes que já foram afectados pela doença”, recordando as estimativas da OMS que apontam para que “só menos de 15% destes doentes é que consegue recuperar-se até ao fim de ano de desenvolver os sintomas”.
Portanto, “estes doentes precisam de um seguimento que lhes garanta o acesso à investigação que está a ser feita para novos tratamentos, a todos os exames de que necessitam”, porque se estes doentes não recuperarem isso vai ter impacto na qualidade de vida em sociedade, como no absentismo laboral e escolar, e na vida pessoal.
O ex-coordenador do gabinete da Ordem destacou mesmo que “o Governo já deveria estar a avançar para as condições que permitissem criar este plano nacional de abordagem para a doença pós-covid com o foco na criação de centros de referência, para haver uma abordagem estruturada e assente na melhor evidência com o objectivo de se atingirem os melhores resultados”.
Senão, “vai ser um problema enorme para o SNS, já viu o que é ter de acompanhar mais de 330 mil novos doentes?”.
De acordo com o médico, os doentes com Longo Covid continuam a chegar às consultas, três anos depois do início da pandemia, “com uma grande variedade de sintomas e muitos deles já com muitas consultas de especialistas sem nenhum conseguir identificar o que tinham”.
Filipe Froes salientou que, “curiosamente, os sintomas que estão a aparecer mais recentemente têm a ver com a área neurologia”, mas há outros relacionados com a área respiratório e cardiológica. “Há situações de doentes que justificam esta enorme preocupação da OMS”, disse.
Países devem manter forte vigilância ao vírus
Ontem, o director-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, deixou claro que, “no último ano, o comité de emergência e a OMS têm estado a analisar todos os dados com cuidado, para perceberem qual seria o tempo certo para baixar o nível de alarme e, na quinta-feira, “o comité de emergência reuniu-se pela 15.ª vez e recomendou-me que declarasse o fim da emergência global.
Eu aceitei esse conselho”, mas tal “não quer dizer que a covid-19 terminou como uma ameaça de saúde”, porque “na última semana, a covid-19 continuou a reclamar vidas a cada três minutos e, estas, são apenas as mortes que sabemos”.
O director-geral lembrou que “o SARS COV-2 está para ficar” e que continua a haver “milhares de pessoas em todo o mundo a lutar pela vida nos cuidados intensivos e outros milhões que continuam a viver com os efeitos debilitantes da condição pós-covid-19”, sublinhando: “O pior que cada país pode fazer agora é usar esta notícia como razão para baixar a guarda, para desmantelar os sistemas que tem montado ou para mandar a mensagem aos cidadãos que não têm nada com que se preocupar”.
Pelo contrário, decisão agora tomada “significa que, na prática, os países podem passar do modo de emergência para a gestão da covid-19” em simultâneo com outras doenças infecciosas.
Ou seja, os países devem manter uma “forte vigilância e monitorização das variantes do SARS-CoV-2, incluindo sequenciação estratégica e geograficamente representativa para rastrear variantes conhecidas e futuras, agentes patogénicos respiratórios e outras ameaças pandémicas”.
Foi neste sentido que a OMS decidiu avançar para um plano global para a gestão da covid-19 até 2025, sobretudo com o foco nos milhões de casos de Longo Covid, que vão continuar a necessitar de cuidados médicos.
O Plano Estratégico de Prontidão e Resposta (SPRP, na sigla em inglês) recebe assim uma quarta actualização para apoiar os países na transição da fase de emergência da pandemia para a gestão da doença a longo prazo.
O plano anterior, divulgado em 2022, definiu como objectivos estratégicos a redução da circulação do coronavírus SARS-CoV-2 a nível mundial e o diagnóstico e tratamento da covid-19 para reduzir a mortalidade, a morbilidade e as sequelas a longo prazo.
A nova estratégia mantém estes dois objectivos, mas acrescenta um terceiro: a prevenção, controlo e gestão sustentada da doença nos próximos anos, colocando uma “forte ênfase na abordagem da condição pós-covid” (também chamada como Longo Covid).
Tendo em conta que “as estimativas actuais sugerem que cerca de 6% das infecções sintomáticas resultam em Longo Covid, isto quer dizer que centenas de milhões de pessoas vão precisar de cuidados de longo prazo”.
Para atingir este objectivo, a OMS propõe uma estratégia assente no “acesso e uso optimizado de ferramentas seguras e eficazes”, como a vacinação de populações de risco para prevenir a doença grave e morte e o diagnóstico precoce e tratamento, especialmente das pessoas mais vulneráveis.
Ministério diz que dia de ontem foi simbólico
O DN perguntou ao Ministério da Saúde se estava a ser pensado um Plano Nacional para tratamento de doentes com Longo Covid, mas não obteve resposta.
A meio da semana a tutela fez sair um comunicado reconhecendo que o dia de ontem era simbólico, representando “a vitória da perseverança sobre a hesitação, da ciência sobre o desconhecido, da solidariedade sobre o egoísmo, da comunidade sobre o individualismo”.
Na nota enviada às Redacções, a tutela destaca o papel dos portugueses, dizendo que “demonstraram uma enorme capacidade de adaptação, acolheram as orientações sanitárias e aderiram fortemente à vacinação.
Os trabalhadores dos sectores essenciais mantiveram-se ao serviço, as autarquias e as instituições sociais disseram “presente”. E que “o Governo agiu para proteger as pessoas e a economia”.
765.000.000 Milhões de Infecções no mundo.
Este é o número oficial de infecções provocadas pelo SARS-CoV-2 em todo o mundo, segundo os dados mais recentes divulgados pela OMS. Mas a este número junta-se o número de vítimas.
Oficialmente, estão registadas 6,9 milhões de mortos, mas o próprio director-geral da OMS admitiu ontem que o número real de óbitos é bem mais elevado, devendo atingir, “pelo menos, 20 milhões”. Em Portugal, os dados oficiais da DGS dão conta de mais de 5,5 milhões de infecções ( 5.580.792 ) e de mais de de 26 mil mortes (26.550)· .
D.N.
Ana Mafalda Inácio
06 Maio 2023 — 00:15
Web-designer, Investigador
e Criador de Conteúdos Digitais
published in: 5 meses ago